Quem é o médico pediatra investigado por estupro de vulnerável na Paraíba? Conheça Fernando Cunha Lima

O médico Fernando Paredes Cunha Lima, de 81 anos, é uma figura quem, até muito recentemente, gozava de enorme destaque e respeitabilidade na comunidade paraibana, tanto por sua atuação como pediatra quanto por seu envolvimento em questões culturais. No entanto, sua reputação está agora gravemente comprometida devido a uma série de denúncias, que incluem acusações feitas por membros de sua própria família, envolvendo o gravíssimo crime de estupro de vulnerável.

A carreira do médico Fernando Cunha Lima

Fernando Paredes Cunha Lima registrou-se no Conselho Regional de Medicina (CRM) do Distrito Federal em 1971, mas logo transferiu sua inscrição para a Paraíba, onde construiu uma sólida carreira como pediatra. Sua clínica, localizada no bairro de Tambauzinho, capital paraibana, é uma das mais tradicionais. Além de sua atuação médica, Cunha Lima sempre esteve envolvido em atividades sociais, sendo membro da diretoria da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de João Pessoa (APAE) até recentemente.

Além de médico, Fernando Paredes Cunha Lima também é escritor e poeta, tendo publicado várias obras, como “Fernando em Pessoa”, “Girassóis Urbanos” e “Sonetos com Nome de Soneto”, obras que o tornaram um nome respeitado nos círculos culturais paraibanos.

Laços de família

Pertencendo a uma das famílias mais tradicionais da Paraíba, ele é irmão de Arthur Cunha Lima, ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, afastado do cargo após investigações da Operação Calvário, que apurou desvios de recursos públicos destinados à saúde e educação. A família Cunha Lima, com todo seu histórico de influência política na região, tem colecionado escândalos que não se limitam ao campo da tradicional corrupção em que estão envoltas tantas oligarquias tradicionais brasileiras, mas facilmente avançam por capítulos muito mais sérios do Código Penal.

Por exemplo Ronaldo Cunha Lima, primo do médico Fernando Cunha Lima e ex-governador da Paraíba, foi acusado de tentar matar o ex-governador Tarcísio Burity. Processado enquanto deputado federal, seu caso foi julgado inicialmente pelo STF devido ao foro privilegiado. Em 2007, ele renunciou ao mandato, transferindo o processo para a justiça comum, onde o caso foi reiniciado. Ronaldo morreu em 2012, antes que o julgamento pudesse ser concluído, resultando no encerramento do processo sem condenação.

Cássio Cunha Lima, filho do ex-governador Ronaldo Cunha Lima e primo em segundo grau de Fernando Cunha Lima, deixou o governo da Paraíba de forma abrupta em 2009, após ter seu mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A cassação ocorreu devido a acusações de abuso de poder econômico e político durante a campanha de 2006, em que foi reeleito. Especificamente, ele foi acusado de distribuir cheques do programa social “Cheque Moradia” durante o período eleitoral, na prática, compra de votos. Após a cassação, o segundo colocado nas eleições, José Maranhão, assumiu o governo.

Agora, o escândalo envolvendo Fernando Cunha Lima não se limita à esfera pública. As denúncias de abuso sexual vêm de dentro da própria família. Gabriela Cunha Lima, filha de Arthur Cunha Lima e sobrinha do pediatra, foi uma das primeiras a revelar que teria sido abusada por ele quando tinha apenas 9 anos. Segundo relatos, Gabriela contou sobre o abuso à família em 1993, mas o caso não foi levado à justiça na época, resultando em um afastamento entre Arthur e Fernando, sem, no entanto, uma formalização das denúncias. Outras duas irmãs de Gabriela também afirmam terem sido vítimas do tio.

Denúncias

As investigações contra Fernando Cunha Lima começaram a ganhar força após a primeira denúncia formalizada em 25 de julho deste ano. Uma mãe acusou o pediatra de tocar as partes íntimas de sua filha de 9 anos durante uma consulta. A denúncia foi feita na Delegacia de Repressão a Crimes contra a Infância e Juventude, desencadeando uma série de outras acusações.

Entre as denúncias mais chocantes estão as feitas pelas duas sobrinhas do médico, que alegam terem sido abusadas por ele durante a infância, na década de 1990. Gabriela Cunha Lima relatou que sofreu abuso sexual por parte do tio quando tinha apenas 9 anos. O caso foi revelado por Gabriela apenas em 1993, o que resultou em um rompimento familiar entre seu pai, Arthur Cunha Lima, e o irmão, Fernando. No entanto, nenhuma denúncia formal foi feita na época.

Até o momento, cinco denúncias foram formalizadas contra o médico, sendo três delas feitas por mães de crianças que foram suas pacientes e duas por suas sobrinhas. De acordo com o advogado Bruno Girão, há cerca de 20 outras pessoas que relataram novos casos, embora ainda não tenham oficializado as denúncias.

Repercussão

A APAE de João Pessoa anunciou o afastamento de Fernando Cunha Lima de suas funções diretivas após a divulgação das acusações. A entidade esclareceu que o médico não atuava como profissional de saúde na instituição desde 2022 e que, enquanto voluntário, sempre realizava consultas na presença de familiares e membros especializados da equipe multiprofissional.

Além disso, o Conselho Regional de Medicina da Paraíba (CRM-PB) informou que abriu uma sindicância para apurar as denúncias. A Sociedade Paraibana de Pediatria também acompanha de perto o caso, aguardando os desdobramentos das investigações.

Homenagem sob contestação

Em 2015, Fernando Cunha Lima foi homenageado pela Câmara Municipal de João Pessoa com a Comenda Poeta Ronaldo Cunha Lima (sim, o mesmo poeta que supostamente tentou matar Burity), em reconhecimento aos seus serviços prestados à sociedade. No entanto, com a revelação das denúncias, o vereador Bruno Farias, autor da homenagem, anunciou que apresentará um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) para revogar a comenda.

“Fizemos uma verificação rigorosa à época, pesquisando certidões cíveis e criminais. Não havia nada que desabonasse a conduta do médico. A sociedade desconhecia os fatos que agora vieram à tona, e que nos deixaram a todos perplexos”, afirmou Farias em recente sessão na Câmara de João Pessoa.

Arthur Cunha Lima tentou matar o irmão

Ontem (07), em entrevista ao programa Correio Verdade, da TV Correio/Record TV, Gabriela Cunha Lima revelou que seu pai, Arthur Cunha Lima, tentou matar seu irmão, o pediatra Fernando Cunha Lima, após descobrir que ele a havia abusado sexualmente.

Gabriela, agora com 41 anos, contou que foi vítima do tio em 1991, quando tinha apenas 9 anos.

Ela relatou que seu pai procurou o irmão com a intenção de matá-lo, mas não conseguiu encontrá-lo, pois Fernando estava viajando na época. “Meu pai não nasceu para ser um assassino”, afirmou Gabriela.

Segredo de Justiça

Devido à gravidade das acusações e ao envolvimento de menores, o caso corre em segredo de justiça. A delegada responsável, Isabela Emanuela, optou por não conceder entrevistas, e reforçou a seriedade e a confidencialidade das investigações.

O médico, já com 81 anos de idade, com certeza goza de recursos financeiros e influência política de sobra e muito provavelmente não viverá para ser condenado por nenhum de seus supostos crimes, os quais sua defesa nega, com veemência.

ATUALIZAÇÃO 09/08/2024:

Advogado revela que o número de vítimas que alegam ter sido estupradas ou assediadas pelo pediatra Fernando Cunha Lima já chega a pelo menos 20 pessoas

O médico, que deveria prestar depoimento nesta sexta-feira, 9, teve sua presença adiada após dar entrada em um hospital privado de João Pessoa, alegando problemas de saúde. Um atestado médico foi apresentado, e a delegada responsável pela investigação aguarda um documento oficial para justificar a ausência.

Em entrevista à Rádio Manaíra FM 103,3 MHz, o advogado Eduardo Fontes comentou: “Se ele deseja justiça e colaborar com as investigações, e considerando sua saúde fragilizada, que aproveite a alta médica para comparecer à delegacia e prestar os esclarecimentos necessários.” Fontes também mencionou que, além das cinco denúncias já formalizadas, há mais de 20 pessoas com relatos que ainda não foram oficializados. Ele encorajou as famílias a procurarem a delegacia para formalizar suas queixas. Os casos em questão remontam a um período de 40 anos, sendo o mais recente datado de 25 de julho.

A defesa de Fernando Cunha Lima, acusado de abusar de crianças, incluindo sua própria sobrinha, declarou em nota à imprensa que as acusações são injustas e que o médico está disposto a colaborar com as investigações. Contudo, na madrugada desta quinta-feira, ele foi internado em um hospital particular de João Pessoa devido a problemas de saúde.

Edição e texto: Pedro Galhardo