Home / Brasil e Mundo / Brasil lidera desinformação sobre vacina na América Latina, diz estudo

Brasil lidera desinformação sobre vacina na América Latina, diz estudo

No Dia Nacional da Vacinação, um estudo acendeu um alerta vermelho sobre o cenário brasileiro: uma avalanche de desinformação sobre vacinas circula livremente nas redes sociais, especialmente no Telegram, tirando do Brasil o título indesejado de líder na América Latina quando o assunto é disseminação de fake news contra imunizantes. O levantamento, produzido pelo Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV), mapeou 81 milhões de mensagens publicadas em quase 2 mil comunidades latino-americanas e caribenhas de teorias da conspiração, no período entre 2016 e 2025. Desse total, o Brasil respondeu por 580 mil conteúdos falsos ou equivocados relacionados a vacinas — o mais alto do continente e nada menos do que 40% de todos os materiais do gênero.

De acordo com Ergon Cugler, coordenador da pesquisa, o ambiente digital brasileiro, ainda pouco regulado, potencializa esse fenômeno. “As plataformas lucram com o engajamento por meio do medo e a sociedade polarizada cria um terreno fértil para o discurso conspiratório”, afirmou. O resultado é uma engrenagem potente de desconfiança, que coloca em risco a saúde coletiva e dificulta as campanhas nacionais de imunização.

O repertório de falsas alegações encontrado nos grupos de conspiração inclui acusações graves e sem qualquer embasamento científico. Entre as mais frequentes está a de que as vacinas causam morte súbita, presente em cerca de 15,7% das mensagens analisadas. Logo atrás vêm boatos de alterações no DNA (8,2%), desenvolvimento de Aids (4,3%), envenenamento (4,1%) e câncer (2,9%). Esses materiais não apenas semeiam dúvidas, mas também promovem falsos antídotos: substâncias químicas perigosas como o dióxido de cloro, além de práticas pseudocientíficas e alternativas espirituais, são oferecidas como “solução” para supostos males causados pela imunização.

O Ministério da Saúde foi categórico em alertar para os riscos de seguir esse tipo de orientação. O uso inadequado de substâncias como o dióxido de cloro — propagado indevidamente como cura milagrosa durante a pandemia — pode causar intoxicações graves e ser fatal. Apesar disso, discursos antivacina se aproveitam do medo para transformar hesitação em mercado, vendendo produtos, cursos e terapias supostamente capazes de reverter danos imaginários.

As consequências desse fenômeno já são visíveis. Apesar de o Brasil ter tradicionalmente apresentado altas taxas de aceitação de vacinas, com 97% da população adulta reconhecendo a importância da imunização infantil, a pandemia de covid-19 trouxe um cenário de polarização que fragilizou historicamente bons indicadores. Atualmente, a cobertura vacinal brasileira está abaixo do necessário, mesmo com pesquisas mostrando que a maior parte das pessoas hospitalizadas em UTIs durante a pandemia não estava imunizada.

A desinformação sobre vacinas não afeta apenas as decisões individuais — profissionais de saúde, incluindo pediatras, também têm demonstrado hesitação vacinal, influenciados por narrativas conspiratórias que desacreditam a segurança e a eficácia dos imunizantes. Segundo especialistas, a desinformação funciona como uma epidemia: se espalha rapidamente, exige vigilância constante e pode causar danos reais à saúde pública, inclusive mortes evitáveis.

O governo federal lançou recentemente um programa dedicado ao combate de fake news sobre vacinas, que visa monitorar, analisar e responder a conteúdos enganosos, além de orientar a população sobre denúncias em canais oficiais das plataformas digitais. A estratégia é uma tentativa de conter o avanço da desinformação e reverter a queda nas coberturas vacinais, mas especialistas apontam que o desafio é enorme diante do volume e da sofisticação dos discursos antivacina.

A situação do Brasil expõe a necessidade urgente de regulação, educação e comunicação qualificada. A difusão de conteúdos falsos sobre vacinas não é apenas preocupante por seus resultados imediatos, mas porque põe em risco o futuro de políticas públicas essenciais à saúde coletiva. Enquanto o debate público segue polarizado e movido pelo medo, o país precisa de respostas firmes baseadas em ciência, transparência e responsabilidade compartilhada.

Estar na liderança regional de desinformação sobre vacinas coloca o Brasil diante de um desafio que vai além da saúde: preservar o direito à informação confiável, proteger a vida e fortalecer a confiança social nas campanhas de imunização é, hoje, tarefa fundamental para o Estado, a mídia, os educadores e cada cidadão.

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)