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Metanol: crise completa um mês com alerta para falsificação de bebidas

Há pouco mais de um mês, quando o primeiro alerta sobre casos suspeitos de intoxicação por metanol em bebidas alcoólicas foi emitido no Brasil, a sensação era de perplexidade: pessoas em bares e restaurantes começaram a apresentar sintomas graves — que vão de náuseas, dores de cabeça intensas e cegueira irreversível até falência múltipla de órgãos — após consumirem destilados como gim, uísque e vodca. O que parecia isolado rapidamente se transformou em uma crise sanitária, expondo a fragilidade de um mercado de bebidas que, de acordo com investigações, seria movimentado também por falsificadores dispostos a cortar custos e ampliar lucros com produtos adulterados e potencialmente fatais.

A origem do problema, descoberta após semanas de apuração, aponta para uma cadeia de fraudes: bebidas falsificadas, produzidas com álcool combustível que também estava adulterado — e que, por isso, continha altas concentrações de metanol, substância industrial altamente tóxica destinada a anticongelantes e limpadores de para-brisa, mas jamais ao consumo humano. A confirmação veio após análises laboratoriais feitas pelo Instituto de Criminalística de São Paulo, que atestaram a presença do metanol em níveis muito acima dos encontrados nos processos tradicionais de destilação. Ou seja: o veneno fora adicionado de forma intencional, e não era fruto de falhas técnicas na produção de destilados legítimos.

Em cerca de vinte dias entre o primeiro alerta e a localização dos postos que venderam o combustível adulterado no ABC paulista, os casos de intoxicação se multiplicaram. Até o momento, o Ministério da Saúde confirmou 58 casos de contaminação, dos quais 15 evoluíram para óbito. O estado de São Paulo concentra a maioria dos casos, mas Paraná e Pernambuco também registraram mortes. Ao todo, 50 casos seguem sob investigação e mais de 600 notificações já foram descartadas. O perfil dos contaminados segue sendo identificado, mas, diferentemente do padrão anterior de casos associados ao uso indevido de produto químico por populações em situação de rua, dessa vez os atingidos estavam em estabelecimentos comerciais e não tinham relação entre si.

A rápida mobilização dos órgãos públicos, dos Centros de Informação e Assitência Toxicológica (Ciatox), vigilâncias sanitárias, polícias estaduais e federais contribuiu para agilizar as análises, embora não tenha sido possível impedir novos casos. Hospitais pólo foram organizados mesmo fora das áreas com casos confirmados, pois o país inteiro está atento a possíveis emergências. Testes rápidos, desenvolvidos por universidades públicas, já começam a ser empregados no rastreamento das bebidas adulteradas. Um exemplo é o “nariz eletrônico”, equipamento criado por pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco, capaz de identificar a presença de metanol em gotas de bebidas alcoólicas, agilizando a fiscalização e a proteção dos consumidores.

A crise levou o governo federal a criar um comitê de enfrentamento, anunciar o reforço no estoque de antídotos — etanol farmacêutico e fomepizol — e emitir alertas sobre os sintomas e o tratamento. A orientação aos profissionais de saúde é clara: reconhecer precocemente os sintomas, administrar o antídoto o quanto antes, encaminhar casos graves para unidades de terapia intensiva e notificar imediatamente as autoridades. Essas medidas podem salvar vidas, mas o problema central segue sendo a adulteração intencional, um crime de alta periculosidade e sem controle imediato.

No campo legislativo, a crise impulsionou a discussão sobre a criminalização da adulteração de alimentos e bebidas, com a possibilidade de o Congresso Nacional transformar o ato em crime hediondo. Em São Paulo, uma Comissão Parlamentar de Inquérito deve investigar os fatos, ouvindo autoridades e buscando responsabilizar os envolvidos nessa fraude, que expôs milhares de consumidores a riscos gravíssimos.

Enquanto as investigações avançam, bares, restaurantes e consumidores seguem em alerta. O mercado formal reagiu com quedas no consumo, mas o risco permanece, especialmente onde a fiscalização é menos efetiva. A crise do metanol escancarou uma realidade: a falsificação de bebidas é um negócio lucrativo e mortífero, que desafia o poder público e exige respostas integradas e permanentes. A responsabilidade, agora, é de todos: do poder público, do setor produtivo e, em última análise, do consumidor, que precisa estar atento à origem e à qualidade dos produtos que consome.

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)