Home / Brasil e Mundo / Mãe denuncia execução em operação e cobra políticas para a juventude

Mãe denuncia execução em operação e cobra políticas para a juventude

O Rio de Janeiro vive dias de luto e choque. No calendário do estado, 28 de outubro de 2025 entrou para a história como a data da operação policial mais letal já registrada. A ação, batizada de Operação Contenção, foi deflagrada nos complexos do Alemão e da Penha, considerado o principal reduto do Comando Vermelho, uma das facções mais influentes do tráfico no estado. Mais de 2.500 policiais civis e militares foram mobilizados, e o balanço oficial — ainda parcial — contabiliza mais de 130 mortos, entre suspeitos e quatro policiais, além de dezenas de presos, tonelada de drogas apreendida e uma quantidade sem precedentes de armas de guerra retiradas das ruas.

A justificativa oficial para a ação foi o combate ao narcoterrorismo e à expansão territorial da facção. O governo estadual informou que o planejamento levou 60 dias, com centenas de mandados de prisão e busca e apreensão cumpridos por determinação judicial. Mas a dimensão da operação e seu impacto ultrapassam os números. Moradores das favelas atingidas relatam cenas de carnificina, medo, trauma e marcas profundas de violência. “Isto não foi uma operação, foram assassinatos. Eles não vieram para prender, vieram para matar”, desabafa Monique Santilano, proprietária de um salão de unhas no Complexo do Alemão.

O cotidiano desses territórios, que abrigam mais de 110 mil pessoas, é atravessado por uma lógica de guerra. Durante a ação, vias foram interditadas, serviços de transporte suspensos e escolas fecharam as portas. O socorro aos feridos foi dificultado por barricadas de carros queimados erguidas por criminosos, e policiais relataram confrontos diretos com traficantes fortemente armados. Câmeras corporais e drones registraram o uso de artefatos explosivos, tiroteios e uma operação que, visualmente, lembra zonas de conflito.

Por trás das estatísticas, há histórias de perda. Tauã Brito, 36 anos, moradora do Complexo da Penha, recebeu a Agência Brasil na casa de um parente para contar sobre o filho Wellington, de 20 anos, vítima fatal da operação. Mãe solo desde muito cedo, Tauã construiu uma vida dedicada ao filho, trabalhando como garçonete, vendedora e confeiteira para garantir que ele completasse o ensino médio e tivesse acesso a oportunidades. “Wellington foi uma criança muito amada, brincalhona, estudioso e namorador. Tem um monte postando foto dele. Ele era lindo, meu menino”, diz, entre lágrimas.

No último diálogo com o filho, ela recomendou que ele repetisse trechos do Salmo 91, buscando conforto e proteção. Dias depois, ao identificar o corpo, Tauã encontrou as mãos de Wellington amarradas. “Se um policial conseguiu chegar no meu filho, amarrar o braço dele e dar uma facada nele, é porque ele não oferecia mais perigo. Então, por que não levou preso? No Brasil, não tem pena de morte. Se a pessoa não oferece perigo, tem que ser presa”, questiona.

O relato de Tauã ecoa denúncias de moradores e entidades de direitos humanos, que apontam para possíveis execuções extrajudiciais, tortura e uso excessivo de força por parte do Estado. A Defensoria Pública do Rio informou que todos os corpos dos suspeitos mortos foram liberados do Instituto Médico-Legal, após perícia concluída, e que a maioria não era de moradores locais, mas pessoas de outros estados. Ainda assim, pesquisadores alertam que operações desse porte não abalam a estrutura do crime organizado, mas deixam cicatrizes profundas na população civil, marcada por traumas, dor e a sensação de abandono.

O governador Cláudio Castro afirmou em entrevista coletiva que o objetivo era “deixar claro que quem exerce o poder é o Estado”, garantindo que os “verdadeiros donos desses territórios são os cidadãos de bem, trabalhadores”. Mas, para muitos que vivem sob fogo cruzado, a fronteira entre segurança pública e violência institucional é cada vez mais tênue.

Enquanto as famílias começam a enterrar seus mortos e a favela tenta retomar a rotina, a certeza é de que a ação policial de outubro de 2025 será lembrada não apenas pelo volume de apreensões, mas pela dor e pela pergunta que fica: até onde o Estado pode ir em nome da ordem, e qual o custo humano dessa guerra sem fim?

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)