Em um Brasil de dimensões continentais e seis biomas distintos, a exposição digital “Você Já Escutou a Terra?” surge como uma experiência singular, capaz de unir, na tela, mais de cinquenta histórias de vida registradas entre 2024 e 2025. O acervo, disponível gratuitamente até o dia 1º de fevereiro de 2026, se desdobra em vídeos, sons e imagens que revelam como povos indígenas, agricultores, artistas, quilombolas, cientistas e guardiões da natureza vivem, resistem e buscam soluções diante das transformações do território. Organizada pelo Museu da Pessoa, a mostra vai além do registro documental: convida o público a refletir sobre a relação entre seres humanos e o planeta a partir do conceito de escuta biocêntrica, que reconhece o valor igual a todas as formas de vida.
A curadoria, assinada por Ailton Krenak e Karen Worcman, não se limita a reunir narrativas; propõe uma leitura coletiva do país, onde a ideia de pertencimento à Terra é compreendida como uma experiência comum, e não individual. Krenak, liderança indígena reconhecida internacionalmente, sugere que olhar o mundo a partir desse movimento biocêntrico ajuda a entender por que os povos originários são tão ligados aos seus lugares de origem. “O jeito de estar na terra é comum, é coletivo”, afirma, destacando a importância da comunidade e do coletivo na construção das relações com o meio ambiente.
Karen Worcman, fundadora do Museu da Pessoa, lembra que, ao longo de sua trajetória, projetos como esse têm buscado ampliar o diálogo com públicos diversos, mostrando como histórias de vida são ferramentas de transformação social. “É nessa perspectiva que apresentamos essa exposição, convidando cada visitante a se reconhecer como parte dessa grande teia comum de vida”, diz. O recado é claro: não se trata de observar, mas de ouvir, sentir e se reconhecer como parte integrante do todo.
Para além do universo digital, Belém recebe a versão presencial da exposição no Museu do Estado do Pará. A mostra física, também gratuita, imerge o visitante em uma experiência sensorial: no módulo “O Manto”, a crosta terrestre é simulada por uma instalação feita de resíduos e tecidos coletados em diversas regiões do país. Sons da natureza, ruídos do cotidiano e vozes humanas se misturam, criando uma atmosfera que sugere não apenas observar, mas escutar ativamente a Terra. O percurso é dividido em quatro módulos, elaborados com auxílio de nomes como Marcelo Larrea na expografia e Benjamin Taubkin na trilha sonora.
A exposição faz parte da programação “Vidas, Vozes e Saberes em um Mundo em Chamas”, apoiada por instituições culturais e empresas de grande porte, entre elas o Ministério da Cultura, a Petrobras e a Fundação Itaú. O resultado é uma iniciativa que une o digital ao físico, o individual ao coletivo, o Brasil real ao imaginário, desafiando o visitante a repensar sua relação com o meio ambiente a cada história ouvida, a cada imagem vista, a cada som captado.
Em um planeta acelerado por mudanças climáticas e crises ambientais, “Você Já Escutou a Terra?” oferece um momento de pausa, escuta ativa e reflexão: a terra, afinal, tem resposta para todos nós, nos lugares de onde nos originamos. E, talvez, seja no encontro dessas histórias que encontrarmos caminhos para um futuro mais coletivo, biocêntrico e, quem sabe, possível.

