Aliados de Bolsonaro dificultam isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil e favorecem milionários, apontam economistas

Brasília - O senador Ciro Nogueira, autor do projeto de lei que dispõe sobre a exploração de jogos de azar em todo o território nacional, durante sessão da CCJ Senado (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A proposta do governo federal de ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para quem ganha até R$ 5 mil mensais enfrenta forte resistência de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro no Congresso. O Partido Progressistas (PP), liderado pelo senador Ciro Nogueira, apresentou uma emenda que, segundo especialistas, reduz drasticamente o potencial de arrecadação da medida e beneficia um grupo restrito de milionários.

O texto original do governo previa a criação de um imposto mínimo de 10% sobre rendimentos anuais acima de R$ 600 mil, como forma de compensar a perda de receita com a ampliação da isenção. No entanto, o PP propôs reduzir essa alíquota para 4% e elevar o limite de incidência para R$ 1,8 milhão anuais. Segundo os economistas Sérgio Gobetti e Frederico Dutra, a mudança faria a arrecadação cair de R$ 25,8 bilhões para apenas R$ 5,5 bilhões — uma redução de cerca de 80%.

Além disso, a proposta do PP estabelece uma alíquota progressiva, que só ultrapassaria os 10% para quem ganha acima de R$ 546 milhões por ano, um universo de menos de 30 pessoas no país. Para quem recebe até R$ 20 milhões anuais, a alíquota ficaria em torno de 4,2%.

De acordo com nota técnica do Observatório de Política Fiscal do Ibre/FGV, a emenda apresentada pelo PP, sob o argumento de proteger pequenos e médios empreendedores, na prática beneficia 0,64% das empresas do Simples Nacional — aquelas com lucros superiores a R$ 600 mil anuais — e cerca de 40 mil milionários que, embora atingidos pelo imposto mínimo, pagariam valores significativamente menores do que o previsto inicialmente pelo Executivo.

O senador Ciro Nogueira, ao apresentar a proposta, cumpriu promessa feita a investidores em evento do setor financeiro, onde manifestou preocupação com uma tributação mais progressiva sobre altas rendas. Segundo os especialistas, a medida inviabiliza o objetivo da minirreforma tributária de tornar o sistema mais progressivo, ou seja, de fazer com que quem ganha mais pague proporcionalmente mais imposto.

O relator do projeto, deputado Arthur Lira (PP-AL), também ventilou a possibilidade de retomar o projeto de lei aprovado em 2021 na Câmara, que previa a tributação de dividendos, mas com uma faixa de isenção ampla, beneficiando sócios de empresas com faturamento de até R$ 4,8 milhões anuais. O texto, porém, foi desidratado e não avançou no Senado.

Outra sugestão do PP é compensar parte da perda de arrecadação com o aumento da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) dos grandes bancos. Economistas alertam que essa medida pode encarecer o crédito para consumidores e empresários ou afetar milhares de pequenos investidores, e não apenas os banqueiros.