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Artistas periféricos de auto de Natal lideram lutas em comunidades

Escrevo a reportagem pedida em português, seguindo suas instruções (ignorando o tópico “NOTÍCIAS RELACIONADAS”, sem inserir título no corpo, sem colchetes com fontes e sem subdivisões).

Desde pequeno, George José Mendonça evitava fazer barulho ao revirar o lixo para escolher materiais recicláveis — uma rotina silenciosa para não atrair atenções enquanto ajudava a família no Alto do Morro da Conceição, na zona Norte do Recife. Vinte e sete anos depois, aqueles mesmos objetos de descarte — garrafas plásticas, caixas de madeira e latas vazias — converteram-se em instrumentos sob as mãos do percussionista conhecido como Bob Brown. A transformação dos sons do cotidiano em música começou quando um vizinho e músico local, Lucas dos Prazeres, o apresentou a oficinas e projetos comunitários que deram outro rumo à sua vida.
Lucas, que cresceu no Quilombo dos Prazeres e hoje coordena iniciativas culturais na comunidade, lembra-se de improvisar chocalhos com garrafas cheias de areia e pedrinhas para ensinar as crianças a perceberem ritmo e timbre — gestos simples que acenderam em George a possibilidade de fazer arte com o que o entorno oferecia. O hábito de transformar objetos reutilizados em instrumentos acabou por atravessar gerações: foi no Centro Maria da Conceição, espaço comunitário fundado a partir da doação de um terreno pela família de Lucas, que meninos e meninas encontraram um lugar para aprender, ensaiar e tocar.
A trajetória de Bob Brown revela o entrelaçamento entre vulnerabilidade social e criação artística. O trabalho comunitário não teve como meta primeira formar músicos profissionais, mas cidadãos; ainda assim, mais de 300 jovens já passaram pelas atividades do ponto de cultura e pela Orquestra dos Prazeres, segundo relatos dos coordenadores. Para muitos, o contato com ritmos tradicionais do Nordeste — coco de roda e cavalo marinho entre eles — ofereceu não só técnica, mas uma formação de identidade, senso crítico e orgulho de pertencimento.
No ciclo natalino, essa tradição ganha visibilidade no espetáculo Baile do Menino Deus, um auto de Natal que reúne personagens brasileiros e linguagens populares em apresentações ao ar livre no Marco Zero do Recife. Lucas dos Prazeres participa como intérprete e, na edição deste ano, aparece como um anjo que se movimenta ao som do cavalo marinho, usando guizos nos pés e o tamanco do coco para sapateados que remetem às brincadeiras dos terreiros e às celebrações do território quilombola. O diretor do espetáculo deu a ele liberdade para incorporar esses elementos tradicionais ao corpo cênico, aproximando palco e comunidade.
Para os que veem de dentro desses territórios, a cena é também intervenção social: levar o cavalo marinho e o coco de roda ao teatro popular é reafirmar práticas culturais que sustentam laços comunitários e resistem às pressões da marginalização. Para Bob, voltar ao Marco Zero para assistir ao ídolo e mentor Lucas é um gesto de reconhecimento do percurso — do silêncio prudente ao virar de lixo em tambor — e da potência de projetos que, sem prometer carreira, despertam vocações e ampliam possibilidades de vida.
No Alto do Morro da Conceição, onde a escassez convive com tradições profundas, a música nascida do improviso e do reaproveitamento tornou-se linguagem de afirmação: o que antes era ruído de sobrevivência hoje se transforma em pulsação coletiva, nas rodas do ponto de cultura, nas apresentações da orquestra e nas noites em que o Baile do Menino Deus traz para a rua as vozes e os ritmos que forjaram aquelas histórias.

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)

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