Bolsonaro, em meio às tentativas desesperadas para se reeleger, provocou um calote bilionário na Caixa e até hoje sem precedentes na história centenária do Banco, fundado em 1861 na cidade do Rio de Janeiro. É o que revela a jornalista Amanda Rossi, do Portal UOL.
A primeira tentativa de conquistar o apoio dos eleitores de baixa renda foi por meio do programa Auxílio Brasil, que não teve o impacto esperado nas pesquisas. Diante disso, aliados importantes entraram em cena com o protagonismo do então presidente do banco, Pedro Guimarães.
Bolsonaro criou duas linhas de crédito na Caixa por meio de uma medida provisória, destinadas a esse segmento do eleitorado, resultando na liberação de R$ 10,6 bilhões para 6,8 milhões de pessoas até a data das eleições. No entanto, essas medidas não obtiveram os resultados desejados.
A primeira linha de crédito foi direcionada às pessoas com restrições no nome, denominada SIM Digital. A Caixa emprestou R$ 3 bilhões nesse programa, porém, a inadimplência atingiu 80% neste ano, resultando em um rombo que só pode ser coberto com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), dinheiro de todos os trabalhadores CLT do país.
A segunda linha de crédito foi voltada para empréstimos consignados relacionados ao Auxílio Brasil, em que a Caixa liberou R$ 7,6 bilhões entre o primeiro e o segundo turno das eleições. Com a revisão do governo, mais de 100 mil devedores foram excluídos do Bolsa Família, tornando o pagamento das parcelas incerto.
O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, expressou claramente sua preferência por Bolsonaro durante a corrida presidencial, chegando a afirmar que se mudaria para a África caso a reeleição falhasse. Ele tentava integrar a chapa de Bolsonaro como candidato a vice-presidente, contando com o apoio de Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente.
As medidas adotadas dependiam de um generoso aporte financeiro da estatal para refletir nas intenções de voto, e foi exatamente isso que ocorreu. No entanto, os resultados foram desastrosos.
SIM Digital
No caso do programa SIM Digital, bastava alguns cliques no celular para solicitar o crédito, que variava de R$ 300 a R$ 1.000 para aqueles com até R$ 3.000 em dívidas. Apenas a Caixa se dispôs a assumir o risco, mesmo que outros bancos estivessem aptos a participar do programa, oferecendo juros a partir de 1,95% ao mês.
Em apenas 24 horas, mais de 50 mil contratos foram assinados aderindo ao programa, resultando no empréstimo de R$ 1,3 bilhão pelo banco no primeiro mês. O risco era tão alto que, para cobrir os possíveis calotes, foi criado um fundo garantidor, que recebeu aporte de R$ 3 bilhões provenientes do FGTS.
Um ano depois, a inadimplência chegou a 80%, revelando um cenário preocupante. A atual presidente da Caixa, Rita Serrano, revelou que será necessário acionar o fundo garantidor nos próximos meses. A quantia exata ainda é incerta, mas se a inadimplência se mantiver nos níveis atuais, aproximadamente R$ 1,8 bilhão terá que ser coberto pelo FGTS, enquanto a Caixa terá que arcar com os outros R$ 600 milhões.
Esse prejuízo é resultado de apenas alguns meses de implementação do programa. A expectativa de empréstimos de até R$ 10 bilhões pelo SIM Digital dependia da rotatividade do dinheiro, ou seja, à medida que os primeiros devedores pagassem suas parcelas, o dinheiro retornaria à Caixa para ser emprestado a outras pessoas. No entanto, a inadimplência superou todas as expectativas, com altos índices de atraso nos pagamentos já nos primeiros meses. Como resultado, a Caixa não pôde emprestar mais do que o saldo do fundo garantidor, que era de R$ 3 bilhões. Em apenas três meses, o banco estatal emprestou 86% desse valor, totalizando R$ 2,6 bilhões.
Diante dessa situação, uma medida drástica foi tomada: os empréstimos foram suspensos para pessoas com restrições no nome, indo contra o propósito do programa anunciado. No entanto, essa decisão foi tomada de forma sigilosa, e até hoje o site do banco afirma que negativados podem participar.
Em meio a tudo, surgem as denúncias de assédio sexual contra Pedro Guimarães, levantadas por funcionárias da Caixa que levaram à sua renúncia em junho de 2022.
EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS AUXÍLIO BRASIL
No caso dos empréstimos consignados relacionados ao Auxílio Brasil, a Caixa iniciou a oferta do programa em 10 de outubro, durante o segundo turno das eleições. Embora outras instituições financeiras também pudessem oferecer esse tipo de empréstimo, apenas instituições de pequeno porte se envolveram, com a Caixa concentrando 80% dos créditos do programa. Em média, o banco emprestou R$ 447 milhões por dia útil.
Logo após a vitória de Lula nas urnas, a Caixa interrompeu os empréstimos consignados sem aviso prévio.
Para disponibilizar a quantia de dinheiro necessária para as medidas de Bolsonaro, a Caixa teve que reduzir seus ativos de alta liquidez. No final do ano eleitoral, esse montante chegou a R$ 162 bilhões, uma redução de R$ 70 bilhões em relação ao ano anterior, representando o volume mais baixo da série histórica iniciada em 2017.