Cisjordânia: palestinos atendidos por Médicos Sem Fronteiras relatam ataques violentos diários por parte de colonos e do exército israelense

Pacientes atendidos pela organização relatam violência diária, incluindo agressões físicas, psicológicas e demolições de casas.

O medo constante das agressões e da violência, cometidas por colonos e pelas forças armadas israelenses, tem um enorme impacto na saúde mental dos palestinos na Cisjordânia, especialmente aqueles que vivem na zona rural no sul de Hebron, como em Masafer Yatta. Lá, as ameaças diárias de deslocamento forçado, ataques e, como vimos nas últimas semanas, morte estão sempre presentes. Médicos Sem Fronteiras (MSF) administra clínicas móveis na região, mas várias questões de segurança, incluindo a escalada da violência dos colonos, têm limitado gravemente as atividades.

Mãe palestina recebe atendimento na clínica móvel de MSF em Masafer Yatta, na Palestina/Cisjordânia.
MSF

“Atualmente, estamos vendo múltiplas demolições de casas operadas pelas forças israelenses, que têm vindo às aldeias de Masafer Yatta inúmeras vezes”, relata Frederieke Van Dongen, coordenadora de assuntos humanitários de MSF em Hebron. “Alguns vilarejos tiveram até 85% de suas casas demolidas. As práticas e políticas do governo de Israel para anexar a Cisjordânia estão afetando a saúde física e mental de nossos pacientes. Agora, ataques de colonos, muitas vezes acompanhados pelo exército israelense, estão ocorrendo quase diariamente, e esses ataques estão se tornando mais violentos, resultando em mais feridos e hospitalizações.”

Aumento da violência deixa feridas físicas e mentais

Nos últimos meses, os residentes palestinos de Masafer Yatta enfrentaram intensos ataques dos colonos israelenses. Os residentes descrevem incidentes quase diários: espancamentos, gado solto para pisotear as terras agrícolas, estradas bloqueadas, casas demolidas e pressão psicológica constante.

Em maio, os colonos invadiram a comunidade de Jinba, em Masafer Yatta. Eles deixaram pessoas feridas, plantações destruídas e um medo crescente de que a paz não seja mais possível.

“Eles bateram na cabeça de um idoso, que precisou de mais de 15 pontos”, relata Ali Al Jabreen, morador da comunidade de Jinba. “Uma das pessoas feridas ainda está aqui, com a mão quebrada. E um homem ficou com graves problemas psicológicos após duas semanas na unidade de terapia intensiva. E a violência continua.”

“Eles vieram em três carros — cerca de 17 colonos”, diz Qusay Al-Amour, um jovem que ficou mancando por semanas após um ataque. “Eles espancaram a mim, meu pai e meu irmão Ahmad. Mais tarde naquela noite, eles voltaram. Destruíram nosso abrigo, a clínica e a mesquita. Meu pai ficou em estado crítico, sua frequência cardíaca caiu para 35. Meu irmão ficou inconsciente por dias. Ficamos cercados por mais de uma hora antes que uma ambulância fosse autorizada a passar,” relata.

“Psicologicamente, é difícil”, acrescenta Al-Amour. “Os colonos vêm quase todos os dias, mesmo à noite. Mas vamos sair de casa? Não. Vamos ficar. Minha esperança é que um dia eles vão embora e possamos viver em paz.”

Desde cedo, as crianças também são expostas à violência, à intimidação e à presença constante das forças armadas, o que leva a sintomas de trauma, incluindo pesadelos, ataques de pânico e incapacidade de se concentrar na escola.

“Todos são afetados”, diz Frederieke Van Dongen, coordenadora de assuntos humanitários de MSF. “A ameaça constante de violência faz com que as pessoas passem todos os cenários possíveis em suas cabeças. O que vai acontecer quando os colonos chegarem às suas casas? Se tiverem uma esposa ou filhas grávidas, serão capazes de protegê-las ou não poderão fazer nada? O que vai acontecer se forem deslocados? Se a mãe tiver uma deficiência física, será que ela conseguirá se mudar para um novo local?”, conta Van Dongen.

Resposta de MSF em Hebron

Nos últimos 12 meses, a maioria dos novos pacientes que procurou as clínicas de MSF em Hebron para receber suporte de saúde mental foram admitidos após sofrerem ataques violentos. Somente em junho de 2025, esse foi o motivo de 94% das admissões.

Em Hebron, MSF fornece cuidados médicos e psicológicos e está respondendo às novas necessidades emergentes das pessoas nos vilarejos de Masafer Yatta. Equipes das clínicas móveis prestam cuidados básicos de saúde e apoio à saúde mental a pessoas afetadas por ataques de colonos, incluindo crianças, mulheres e idosos. Profissionais de MSF também oferecem suporte aos palestinos que foram deslocados à força devido à violência dos colonos e à demolição de suas casas.

No entanto, o acesso às comunidades afetadas continua significativamente limitado devido ao aumento dos riscos de segurança. Além do medo de ataques por colonos, os postos de controle militares israelenses e a recente guerra de 12 dias entre Israel e Irã tornaram a situação de segurança ainda mais precária. As equipes no território relatam intervenções médicas atrasadas, estradas bloqueadas e necessidades crescentes em toda a Cisjordânia.

O aumento recente na frequência e na intensidade dos ataques promovidos por colonos e pelas forças armadas israelenses faz parte de uma política sistemática de deslocamento forçado e anexação — uma política que precisa ser encerrada. Como potência ocupante, Israel tem a obrigação de proteger a população palestina. No entanto, as forças israelenses não apenas falham em conter a violência, como frequentemente permitem — ou até participam — dos ataques cometidos por colonos contra civis palestinos. A comunidade internacional tem assistido a essa escalada com inaceitável passividade. Chegou a hora de romper o silêncio e adotar medidas concretas, exercendo pressão política e econômica real.