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Classificar facções como terrorismo expõe Brasil à intervenção dos EUA

A proposta do Projeto de Lei 1.283/2025, que pretende equiparar facções criminosas e milícias à prática do terrorismo, tem gerado intensos debates no Brasil, principalmente pela possibilidade de elevar as penas para os envolvidos e ampliar o escopo legal do terrorismo no país. De acordo com a proposta, atos cometidos por essas organizações, como domínio territorial, intimidação da população e desestabilização da ordem pública, passariam a ser classificados como terrorismo, o que aumentaria a pena de 3 a 8 anos para um intervalo de 12 a 30 anos de prisão. A votação do projeto está prevista para ocorrer na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.

Especialistas em relações internacionais, terrorismo e segurança pública alertam que essa equiparação traz riscos, principalmente por expor o Brasil à estratégia intervencionista dos Estados Unidos na América Latina. Eles destacam que o crime organizado, que busca lucro e movimenta bilhões com atividades como o tráfico de drogas, tem natureza distinta do terrorismo, que envolve sempre um objetivo político por trás dos atos. Além disso, estudiosos ressaltam a importância de diferenciar entre o método terrorista — uma tática de intimidação ou violência — e o terrorismo, que é um fenômeno mais amplo e com motivações políticas claras.

Juristas apontam que, no direito internacional, existe uma distinção definida entre crime organizado e terrorismo, coberta por convenções específicas, e que a ampliação do conceito pode levar a consequências jurídicas e políticas complexas. A coordenadora do núcleo de estudos de terrorismo e crime transnacional da PUC Minas, Rashmi Singh, frisa que a crescente designação de grupos como terroristas pelos EUA tem servido para legitimar ações políticas e militares norte-americanas internacionalmente, muitas vezes em desacordo com o direito internacional humanitário. Ela menciona como exemplo a invasão do Iraque em 2003 e as prisões em Guantánamo, que ocorreram sob a justificativa do combate ao terrorismo.

Singh também alerta para a influência dessa política externa norte-americana no Brasil, destacando que a internalização dessa lógica pode resultar em pressões externas que justifiquem intervenções e afetem a soberania nacional. A maioria dos países e instituições internacionais evita rotular suas organizações criminosas locais como terroristas, tanto para preservar sua autonomia quanto para prevenir complicações legais e políticas.

No cenário político nacional, a tramitação do PL 1.283/2025 ocorre em meio a fortes pressões para o endurecimento no combate ao crime organizado, especialmente após megaoperações policiais nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro. Deputados que defendem a proposta indicam que essa medida é necessária para fortalecer a segurança pública e melhorar a eficácia das ações contra essas facções.

Porém, a aprovação do projeto pode abrir espaço para uma maior interferência dos Estados Unidos no território brasileiro, na linha das ações que já vêm ocorrendo em outras partes da América Latina sob o pretexto de enfrentar o terrorismo ou o narcotráfico, o que desperta preocupação entre especialistas sobre a preservação da soberania nacional e a adequação dos instrumentos legais brasileiros para o enfrentamento da criminalidade organizada.

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)