# Cúpula dos Povos encerra em Belém com críticas ao capitalismo e apelo por justiça climática
A Cúpula dos Povos encerrou neste domingo (16) na Universidade Federal do Pará, em Belém, marcando o final de cinco intensos dias de mobilização paralela à 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30). O evento reuniu cerca de 20 mil participantes desde o dia 12 de novembro em uma programação que confrontou diretamente o modelo capitalista de produção global, apresentando uma visão alternativa para enfrentar a crise climática através da participação popular, justiça ambiental e soberania dos povos.
A mobilização foi marcada por momentos de grande impacto visual e simbólico. O encontro iniciou-se com uma barqueata na Baía do Guajará, reunindo 5 mil pessoas em 250 embarcações. Posteriormente, uma passeata unificou diversos movimentos sociais, alcançando a participação de 70 mil pessoas nas ruas de Belém, segundo informações dos organizadores. Esses atos refletiram a determinação de levar as demandas dos povos originários, juventudes periféricas, trabalhadores e comunidades locais para o centro do debate climático global.
O ponto culminante da Cúpula dos Povos foi a leitura e entrega de uma declaração final monumental. O documento, construído ao longo de dois anos por povos de todo o mundo, foi assinado por 1.109 organizações sociais e movimentos políticos de mais de 60 países. A declaração foi entregue ao presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, em uma cerimônia solene onde ministros do governo federal seguravam as páginas do documento ao lado da autoridade máxima da conferência climática.
A declaração representa uma crítica estrutural ao sistema econômico dominante. O documento aponta o modo de produção capitalista como a causa principal da crise climática crescente e rejeita explicitamente o que denomina “falsas soluções de mercado”. Em vez disso, propõe um projeto político orientado pelo internacionalismo popular e pelo feminismo, pedindo financiamento público e taxação dos mais ricos como instrumentos de justiça climática.
Para Darcy Frigo, integrante da Comissão Política da Cúpula do Clima, a mobilização representou a necessidade de elevar as vozes da população além dos espaços oficiais. “As pessoas viram nessa mobilização popular a possibilidade de gritar mais alto, de gritar coletivamente perante o processo que está acontecendo no espaço oficial da COP30, de onde nós não podemos esperar as soluções que estão demorando demais”, explicou. A mensagem-síntese capturou a essência do sentimento: “Nós gritamos aqui que quem tem a solução são os povos. E os povos dizem: ‘nós somos a solução'”.
Thauane Nascimento, também da Comissão Política da Cúpula, aprofundou a crítica ao modelo vigente. Segundo ela, o sistema capitalista não apenas é responsável pela crise climática, mas também gera “supostas soluções climáticas” que são fundamentalmente falsas. A privatização, mercantilização e financiarização dos bens comuns e serviços públicos foram apontadas como totalmente contrárias aos interesses dos povos, não apenas em Belém ou no Brasil, mas globalmente. “A gente entende que essa organização dos povos é o caminho, é o modelo para a solução dessa crise”, afirmou Thauane.
Entre as demandas específicas contidas na declaração encontram-se a proteção dos territórios indígenas e comunidades locais, reforma agrária popular e rejeição de soluções mercantilistas. O documento também ressalta a importância do conhecimento indígena e da participação direta das populações originárias nas tomadas de decisão sobre políticas climáticas.
O presidente da COP30 recebeu a declaração com reconhecimento de sua importância estratégica. Corrêa do Lago se comprometeu a levar os pleitos dos povos aos espaços de negociação formais da conferência, na sessão de alto nível que iniciou na segunda-feira (17). “Fico muito feliz de poder presidir essa COP com esse apoio que sinto de vocês. Espero que a COP30 seja a COP da virada”, afirmou o embaixador, reconhecendo que a participação massiva da sociedade civil fortalece significativamente a posição do Brasil nas negociações internacionais.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, leu uma carta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o encerramento, reforçando o compromisso governamental com a governança climática e o multilateralismo. O secretário-geral da Presidência, Guilherme Boulos, respondeu a uma das demandas específicas da cúpula, anunciando que não haverá implementação de projetos no rio Tapajós sem consulta aos povos da região, e que será criada uma mesa de diálogo na Secretaria-Geral da Presidência da República para recebê-los.
A Cúpula dos Povos em Belém consolidou-se como um momento histórico de articulação global de movimentos sociais e populares contra o modelo capitalista de desenvolvimento. Sua voz, amplificada por dezenas de milhares nas ruas, agora ecoará nas negociações formais da COP30, representando uma alternativa radical às discussões técnicas e diplomáticas que caracterizam tradicionalmente as conferências climáticas das Nações Unidas.

