A reportagem a seguir, baseada estritamente nos dados e declarações colhidos até esta sexta-feira, 24 de outubro de 2025, retrata um capítulo crucial do embate institucional sobre direitos previdenciários no Brasil.
Em sessão virtual do Supremo Tribunal Federal, o ministro Flávio Dino abriu divergência ao apresentar o primeiro voto de inconstitucionalidade contra a mudança nas regras de aposentadoria por incapacidade permanente (antiga aposentadoria por invalidez) instituída pela reforma da Previdência de 2019. Dino foi enfático ao afirmar que o cálculo atual, baseado em 60% das maiores contribuições previdenciárias, viola princípios fundamentais da Seguridade Social, especialmente o da irredutibilidade dos benefícios. Para ilustrar a distorção, aponta que, com a nova fórmula, o valor do benefício permanente pode ser inferior ao recebido no auxílio-doença, cujo cálculo considera 80% das principais contribuições. Em suas palavras, a nova regra provoca uma redução inaceitável no valor recebido pelo segurado quando passa de um benefício por incapacidade temporária para um permanente, o que configuraria uma afronta direta à Constituição.
Dino defendeu que o cálculo para a aposentadoria por incapacidade permanente deveria ser o mesmo aplicado quando o benefício decorre de acidente de trabalho, isto é, a média aritmética de 100% das contribuições. Segundo o ministro, a atual diferenciação não só fere a dignidade da pessoa humana, mas também os direitos constitucionais das pessoas com deficiência e compromete os princípios de igualdade, razoabilidade e proporcionalidade. Sua posição, contudo, é minoritária: o placar está em 4 a 1 a favor da manutenção da redução, com Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Cristiano Zanin acompanhando o voto do então relator, Luís Roberto Barroso, antes de sua aposentadoria.
Barroso, ao votar em setembro, reconheceu o impacto negativo da reforma nos segurados, mas entendeu que a alteração era necessária para garantir a sustentabilidade financeira da Previdência. Para ele, o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez têm naturezas distintas, não havendo redução direta de valor, mas sim uma nova configuração de cálculo. O ex-presidente do STF alertou para o risco de mudanças repentinas no sistema previdenciário, dado o grande contingente de pessoas afetadas, e defendeu a necessidade de equilíbrio entre direitos sociais e sustentabilidade do sistema.
Ainda faltam votos de ministros como Cármen Lúcia, Edson Fachin, Dias Toffoli, André Mendonça, Kássio Nunes Marques e Luiz Fux, que têm até a próxima segunda-feira para manifestarem-se. A decisão final, portanto, segue em aberto, mas a divergência de Dino destaca o conflito entre a proteção de direitos fundamentais, especialmente de pessoas em situação de vulnerabilidade, e os imperativos de ajuste fiscal que motivaram a reforma. Enquanto a maioria do STF tende a priorizar a sustentabilidade do sistema, Dino chama atenção para o custo social e jurídico da redução, tornando o julgamento um retrato vivo dos dilemas do Estado brasileiro na proteção social.

