O papa Leão XIV, o primeiro pontífice originário dos Estados Unidos, marcou seu primeiro Natal no cargo com um sermão direto e comovente na Basílica de São Pedro, nesta quinta-feira, ao criticar as condições precárias dos palestinos em Gaza. Durante a celebração solene, que reúne milhares de fiéis no Vaticano, ele evocou o nascimento de Jesus em um estábulo para destacar a fragilidade humana, afirmando que Deus havia “armado sua frágil tenda” entre as pessoas do mundo.
“Como, então, podemos não pensar nas tendas em Gaza, expostas por semanas à chuva, ao vento e ao frio?”, questionou o papa, em um apelo raro para um momento tradicionalmente espiritual. Eleito em maio para suceder Francisco, Leão XIV adota um estilo mais calmo e diplomático, evitando geralmente referências políticas, mas desta vez não poupou palavras sobre as mazelas globais.
Na bênção de Natal posterior, o pontífice, que prioriza o cuidado com imigrantes desde o início de seu pontificado, lamentou a situação de migrantes e refugiados “que atravessam o continente norte-americano”. Embora tenha criticado no passado a repressão à imigração pelo presidente Donald Trump, ele não o mencionou nominalmente. Na véspera de Natal, já havia alertado que recusar ajuda a pobres e estrangeiros equivale a rejeitar o próprio Deus.
Leão XIV tem se posicionado repetidamente sobre Gaza, onde quase toda a população permanece desabrigada apesar do cessar-fogo entre Israel e o Hamas, acordado em outubro após dois anos de bombardeios intensos e operações militares, desencadeados por um ataque do Hamas em outubro de 2023. Agências humanitárias relatam que a ajuda ainda chega em volumes insuficientes à região. Há um mês, o papa defendeu a criação de um Estado palestino como única solução viável para o conflito de décadas.
No culto com milhares de participantes, ele também deplorou as condições dos sem-teto em todo o mundo e a devastação provocada pelas guerras. “Frágil é a carne das populações indefesas, provadas por tantas guerras, em andamento ou concluídas, deixando para trás escombros e feridas abertas”, declarou. “Frágeis são as mentes e as vidas dos jovens forçados a pegar em armas, que nas linhas de frente sentem a insensatez do que lhes é pedido e as falsidades que enchem os discursos pomposos daqueles que os enviam para a morte.”
Na tradicional mensagem e bênção “Urbi et Orbi” – “Para a Cidade e o Mundo” –, proferida da sacada central da Basílica de São Pedro para a multidão na praça, Leão XIV pediu o fim de todos os conflitos globais. Ele citou violência na Ucrânia, onde o povo tem sido “atormentado”, e apelou para que “o clamor das armas cesse” e as partes, com apoio internacional, promovam diálogo sincero e respeitoso. Lamentou ainda tensões políticas, sociais e militares no Sudão, Mali, Mianmar e outros países.
Particularmente, dirigiu-se aos combates na fronteira entre Tailândia e Camboja, na terceira semana e com pelo menos 80 mortos, rogando que a “antiga amizade” entre as nações seja restaurada para avançar na reconciliação e na paz. O sermão reforçou o chamado à proximidade com o sofrimento alheio, enfatizando que a paz surge quando a dor dos outros fere o coração e destrói certezas inabaláveis, e que a Igreja deve atuar pela escuta e presença, não pela imposição.

