A defesa da implementação efetiva do Código Florestal reuniu, nesta quinta-feira (23), em Brasília, representantes de pelo menos 30 instituições, incluindo governo federal, Judiciário, Ministério Público Federal, secretarias estaduais de Meio Ambiente e produtores rurais. O encontro reforçou a urgência de acelerar o cumprimento da lei que, desde 2012, busca equilibrar produção agropecuária, proteção da biodiversidade e desenvolvimento sustentável no Brasil. Para todos os setores envolvidos, fortalecer o Código Florestal significa garantir segurança jurídica principalmente aos pequenos agricultores, além de proteger o meio ambiente e fomentar uma agricultura resiliente frente às mudanças climáticas.
O desafio, porém, é gigantesco. Dados do mais recente Panorama do Código Florestal, elaborado pelo Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais, mostram que o país tem um passivo ambiental que exige restauração e regularização em mais de 21 milhões de hectares, um déficit entre 19,3 e 22,6 milhões de hectares, segundo diferentes bases oficiais. Essas áreas, localizadas principalmente dentro de propriedades rurais, não atendem às exigências legais para Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente (APP). O proprietário que desrespeitou o limite mínimo de vegetação nativa está obrigado a recompor a mata, seja por restauração direta ou por compensação ambiental. Trata-se de uma exigência que pode custar centenas de vezes a área de um campo de futebol por propriedade.
Além desse passivo, há outros 74 milhões de hectares que excedem as exigências mínimas previstas na lei — ou seja, já têm vegetação nativa preservada além do exigido. Esses proprietários poderiam, em tese, receber pagamento por serviços ambientais, criando um mercado de incentivo à manutenção da vegetação em pé. Juntos, os dois grupos somam cerca de 95 milhões de hectares aguardando ações de restauração, compensação ou remuneração ambiental, o que demonstra a escala nacional do desafio de implementar a legislação.
O Cadastro Ambiental Rural (CAR), sistema nacional obrigatório para todas as propriedades rurais, foi criado para mapear esse cenário e apoiar a regularização ambiental. Mas, apesar do aumento consistente no número de registros, o uso do CAR como instrumento efetivo de controle e fiscalização ainda avança devagar. A tecnologia e os sistemas federais de gestão têm melhorado, mas a análise e a validação dos dados pelos estados seguem sendo o principal gargalo para transformar o cadastro em política pública prática e justa.
Iniciativas como o PlanaFlor, parceria entre organizações da sociedade civil, governo e setor privado, começaram 2025 com foco na identificação de áreas prioritárias para restauração e na elaboração de normativas que possam destravar a recuperação em larga escala. O plano nacional de recuperação da vegetação nativa (Planaveg) também passa por revisão, buscando integrar critérios de biodiversidade, conectividade de áreas protegidas, segurança hídrica e climática, e segurança alimentar. Mas, para líderes do setor, só será possível avançar de fato com pactos amplos, envolvendo não só cobrança, mas também incentivos, linhas de crédito e apoio técnico para transformar a restauração em realidade.
Há forte consenso entre os presentes no encontro em Brasília: o Código Florestal é mais do que uma lei ambiental; trata-se de um instrumento de política pública essencial para o Brasil cumprir suas metas climáticas internacionais, especialmente as assumidas no Acordo de Paris. O país comprometeu-se a restaurar e manter 12 milhões de hectares de florestas até 2030, mas o déficit real é quase o dobro. Portanto, a discussão não é apenas ambiental: é também econômica, social e estratégica para o país. Proteger a vegetação nativa garante água, solo fértil, captura de carbono e resiliência do agronegócio. Por outro lado, a baixa implementação da lei gera insegurança para quem produz e risco para a reputação internacional do país.
Neste contexto, o pacto proposto pelos diferentes setores tem como objetivo ampliar o engajamento e a coordenação federativa, acelerar a análise do CAR, operacionalizar os Programas de Regularização Ambiental (PRA) e consolidar o mercado de Cotas de Reserva Ambiental (CRA). Há expectativa de que novos instrumentos econômicos, como o pagamento por serviços ambientais, ganhem escala e ajudem a viabilizar a preservação e a recuperação da vegetação nativa.
O caminho está claro: ou o país avança na implementação do Código Florestal, enfrentando de fato seus déficits e transformando a preservação em vantagem competitiva, ou seguirá patinando entre conflitos, insegurança jurídica e ameaça às metas climáticas. O pacto, portanto, não é só necessário — é urgente.

