A obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas brasileiras, instituída pela Lei 10.639/2003, completou mais de 20 anos, mas ainda enfrenta muitos desafios para sua plena implementação em todo o país. Desde sua aprovação, as redes de ensino têm adaptado currículos e processos de formação para incluir essa temática em todas as etapas da educação básica, da educação infantil ao ensino médio. No entanto, questões como resistência cultural, falta de diálogo e dificuldades na formação de professores ainda limitam o alcance e a qualidade desse ensino.
Um exemplo recente que ilustra as tensões relacionadas ao tema aconteceu no mês da Consciência Negra, quando uma escola pública na cidade de São Paulo recebeu a intervenção policial após uma queixa de um pai em razão de um desenho de orixá feito por uma aluna, evidenciando preconceitos e desconhecimento sobre a dimensão cultural e histórica dos símbolos afro-brasileiros. Apesar dessas dificuldades, a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo tem investido na compra de obras com temática étnico-racial e na capacitação dos professores, além de disponibilizar documentos orientadores para subsidiar práticas antirracistas e a integração do conteúdo no currículo escolar.
No âmbito estadual, o programa de formação continuada tem capacitado milhares de docentes, introduzindo conteúdos sobre cultura e religiosidade africanas para que sejam integrados à rotina escolar como componentes essenciais da formação histórica e cultural dos estudantes. Nesse sentido, educadores como a professora Núbia Esteves, atuante há mais de vinte anos em escolas públicas da periferia paulistana, adotam estratégias para abordar os orixás sob a ótica da cultura e mitologia comparada, desvinculando-os do aspecto religioso e aproximando-os de referências culturais universais. Suas aulas promovem reflexões sobre diversidade, ética e valores, utilizando recursos como quadrinhos e debates para desmistificar preconceitos e racismo estrutural.
Apesar dos esforços e avanços, pesquisas recentes indicam que mais de 70% das secretarias municipais no Brasil ainda não desenvolvem ações efetivas para implementar o ensino da história e cultura afro-brasileira, evidenciando a necessidade de superar obstáculos financeiros, formar adequadamente os professores e enfrentar a resistência social e política que torna invisível a contribuição negra na formação da nação. Autoridades, como a ministra dos Direitos Humanos, reconhecem a lei como um marco fundamental na promoção da equidade racial, mas ressaltam que há um longo caminho para consolidar este direito nas escolas e combater o racismo estrutural que ainda permeia a sociedade brasileira.

