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Estudo aponta que financiamento climático no Brasil é desigual

No Brasil, a crise climática acirra as desigualdades, e essa relação ganha contornos dramáticos diante da insuficiência e da desigualdade no financiamento de ações ambientais. É o que revela o estudo Encruzilhada Climática, da Oxfam Brasil, lançado às vésperas do país ocupar o centro das discussões globais com a COP30, marcada para Belém. O relatório expõe como as lacunas orçamentárias não apenas deixam de proteger o meio ambiente, mas aprofundam iniquidades raciais, de gênero e territoriais, atingindo sobretudo quem já vive em situação de vulnerabilidade social.

Fica visível que o peso da crise climática não recai igualmente sobre todos. As regiões Norte e Nordeste do Brasil, onde a pobreza e a presença de pessoas negras, indígenas e quilombolas são maiores, são justamente as mais expostas a secas, enchentes e outros eventos climáticos extremos. Nas favelas e periferias, onde 73% da população é negra, as famílias ocupam áreas de risco, sem infraestrutura adequada para se proteger de desastres. “Estamos diante de um racismo ambiental evidente. A crise climática escancara e aprofunda injustiças históricas. Não haverá transição justa sem enfrentar o racismo, a desigualdade de gênero e a concentração de terras”, avalia Viviana Santiago, diretora-executiva da Oxfam Brasil.

A resposta do Estado brasileiro tem sido, em grande medida, reativa — créditos extraordinários são liberados após desastres, como os R$ 111,6 bilhões destinados às enchentes no Rio Grande do Sul em 2024, quando o prejuízo já está consolidado. No Plano Plurianual 2024-2027, dos R$ 185 bilhões previstos para ações climáticas, apenas 12% vão para adaptação, etapa fundamental para reduzir riscos e proteger comunidades vulneráveis antes que ocorram tragédias. O orçamento destinado à gestão ambiental é quase invisível: em 2023, apenas 0,34% do Orçamento da União foi para essa área, o que significa que, a cada R$ 300 do orçamento federal, menos de R$ 1 é direcionado à proteção do meio ambiente. Enquanto isso, setores como agricultura e transporte, com grande impacto sobre as emissões de carbono, recebem valores muito superiores. O Fundo Clima, por exemplo, contou com R$ 10,4 bilhões, cifra mínima se comparada aos R$ 400 bilhões do Plano Safra 2024/2025.

A escolha orçamentária é definidora do rumo do país. “Privilegia setores que intensificam a crise climática em detrimento da proteção das pessoas e territórios em maior vulnerabilidade”, critica Viviana Santiago. O estudo alerta para o que chama de “racismo ambiental”, entendido como o conjunto de práticas, políticas e omissões que tornam populações negras, indígenas e tradicionais historicamente mais expostas aos impactos da degradação ambiental e às consequências das mudanças climáticas. Fenômenos como a pobreza energética — que atinge, por exemplo, Pará, Amapá e Maranhão, estados ricos em recursos naturais, mas com acesso precário à energia — refletem a exclusão estrutural e regional.

Diante desse panorama, o relatório propõe medidas urgentes para promover justiça climática e social: incorporar recortes de raça, gênero e território em todas as políticas climáticas; garantir participação efetiva de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais nas decisões; destinar recursos prioritariamente à adaptação em territórios mais vulneráveis; e condicionar o crédito rural à adoção de práticas sustentáveis e à redução de emissões. O documento ressalta que a participação popular, contudo, segue limitada, pois processos de consulta nem sempre chegam a comunidades isoladas, muitas vezes sem acesso à internet e distantes dos centros de decisão.

A COP30, marcada para novembro de 2025 em Belém, deverá pautar com força a necessidade de um novo paradigma de financiamento, colocando o Brasil diante de uma encruzilhada estratégica: a chance de liderar globalmente a transição ecológica requer, para ser legítima, enfrentar dentro de casa as desigualdades estruturais que tornam a crise climática ainda mais cruel para milhões de brasileiras e brasileiros.

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)
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