### Justiça Federal Ordena Salvaguarda Urgente de Acervo Histórico no Antigo IML da Lapa
A Justiça Federal do Rio de Janeiro determinou medidas imediatas ao governo do estado para proteger um vasto acervo documental de valor inestimável, ameaçado de destruição no prédio abandonado do antigo Instituto Médico Legal (IML), localizado na Avenida Mem de Sá, na Lapa, região central da cidade. A decisão, proferida em resposta a uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF), impõe prazos rigorosos sob pena de multa de R$ 100 mil em caso de descumprimento.
O prédio, desativado desde 2009, encontra-se em estado de completo abandono, com janelas quebradas, falta de energia elétrica, acúmulo de sujeira, fezes de pombos e presença constante de invasores, usuários de drogas e indivíduos armados. Vistorias técnicas realizadas pelo MPF, Arquivo Nacional, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (Aperj) confirmaram as condições precárias de armazenamento, incluindo microfilmes em base de acetato de celulose em deterioração avançada e, mais alarmante, em base de nitrato de celulose, material altamente inflamável e de risco irreversível.
Em decisão de urgência, a Justiça concedeu **cinco dias** para que o estado do Rio assegure a segurança do local com, no mínimo, dez vigilantes em turno permanente 24 horas por dia, ou por meio da Polícia Civil ou Militar, visando coibir o acesso de intrusos. Além disso, determinou a **remoção integral do acervo para um imóvel próprio ou alugado pelo estado, como o Arquivo Estadual, em prazo improrrogável de 30 dias**. O novo destino deve contar com climatização adequada para preservação, além de estrutura para receber autoridades e instituições dedicadas à higienização, triagem e catalogação, tudo sob supervisão do Iphan.
O acervo em risco compreende cerca de **2.919,83 metros lineares de documentos e aproximadamente 440 mil itens iconográficos**, como fotografias e negativos flexíveis. Ele abrange registros da Polícia Civil entre 1930 e 1960, além de materiais cruciais sobre o período da ditadura militar, incluindo informações sobre desaparecidos políticos, torturas e violações de direitos humanos. Esses documentos são essenciais para a memória coletiva do Brasil, atendendo a obrigações internacionais, como as destacadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Vladimir Herzog, que impõe aos Estados o dever de preservar arquivos sobre graves violações.
A ação inicial do procurador regional adjunto dos Direitos do Cidadão, Julio Araujo, visava obrigar a União a concluir a reversão do imóvel – cedido ao estado em 1965 com cláusula de retorno – assumir a posse e elaborar um plano de ocupação e tratamento dos arquivos. No entanto, a omissão do estado na preservação e a frustração de uma audiência de conciliação levaram à decisão liminar, que enfatiza o interesse nacional na salvaguarda dessa herança histórica, vital para a verdade, a democracia e o direito à memória.
Araujo destacou a gravidade da situação: o acervo está exposto a intempéries, destruição iminente e uso do prédio como “banheiro público”, configurando risco claro de furto, adulteração ou perda total. “Estamos diante de documentos que podem esclarecer violações graves, reconstruir trajetórias de desaparecidos e cumprir decisões internacionais”, afirmou o procurador, reforçando que a deterioração compromete não só a história, mas a própria democracia.
A medida judicial surge após inquérito civil que apurava a destinação do antigo prédio do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), revelando a extensão do patrimônio em perigo. Enquanto o estado não cumpre as determinações, o MPF monitora o caso, garantindo que a preservação avance para evitar uma perda irreparável da história brasileira.

