A aprovação do Projeto de Lei 3935/2008 pela Câmara dos Deputados, que amplia gradualmente a licença-paternidade de 5 para 20 dias, representa um avanço importante na legislação brasileira, embora ainda considerado tardio diante de práticas internacionais mais avançadas. A proposta prevê a extensão do benefício em etapas ao longo de quatro anos, começando com 10 dias, passando para 15 e chegando a 20 dias ao final desse período, com remuneração integral garantida pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Especialistas apontam que, apesar desse avanço, a medida não altera significativamente a realidade da divisão desigual das responsabilidades de cuidado entre homens e mulheres no Brasil. A socióloga e psicanalista Marta Bergamin destaca que os papéis de gênero no país permanecem marcados, com as mulheres assumindo majoritariamente o cuidado dos bebês e das crianças, enquanto os homens permanecem mais ligados ao mercado de trabalho e ao espaço público. Para ela, ampliar a licença-paternidade pode ajudar a envolver mais os pais nos cuidados iniciais, valorizando o desenvolvimento infantil e fortalecendo os vínculos familiares, mas não resolve a dupla jornada de trabalho enfrentada pelas mulheres, ainda vista como as principais responsáveis pelo cuidado dentro das famílias.
Além disso, a socióloga sublinha que a sociedade brasileira enfrenta obstáculos culturais patriarcais e machistas que dificultam mudanças mais profundas na divisão de tarefas parentais. Ela cita como exemplo outros países que adotam licenças parentais maiores e flexíveis, que podem ser compartilhadas entre os responsáveis pelo bebê conforme as preferências e necessidades do casal.
O economista Euzébio Sousa acrescenta que a ampliação da licença-paternidade também traz ganhos econômicos ao sinalizar para o mercado de trabalho a importância do cuidado compartilhado, beneficiando o enfrentamento das desigualdades de gênero que penalizam as mulheres no emprego, seja em relação a salários, progressão de carreira ou condições precárias de trabalho. Ele afirma que essa medida contribui para reduzir a desigualdade, aumenta a produtividade e reforça que o cuidado é uma responsabilidade coletiva, não exclusiva das mulheres.
No entanto, há ressalvas quanto à efetividade da lei, já que o benefício é aplicado apenas a trabalhadores formais, excluindo parcela significativa da população que atua na informalidade, o que limita seu impacto social. O sociólogo Rafael da Costa, que será pai em breve, enfatiza que o Brasil está atrasado em comparação a países europeus, como a Alemanha, que oferecem licença parental compartilhada por até três anos, permitindo que os pais escolham como dividir esse período conforme suas realidades.
Algumas categorias profissionais já garantiram a ampliação da licença-paternidade há quase uma década, como os bancários de São Paulo, Osasco e região, que conquistaram esse direito por meio de campanhas sindicais. A presidente do Sindicato dos Bancários destacou os benefícios dessa conquista para a interação dos pais com os filhos e para uma divisão mais equilibrada das responsabilidades parentais.
Em síntese, a ampliação gradual da licença-paternidade no Brasil representa um avanço social e econômico, ainda que insuficiente para transformar as práticas culturais enraizadas que definem a mulher como principal cuidadora. A medida abre caminho para um debate mais amplo sobre igualdade de gênero, cuidado compartilhado e inclusão social no mercado de trabalho, permanecendo desafios a serem enfrentados nas próximas etapas legislativas e na sociedade em geral.

