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Moradores retiram cerca de 60 corpos em área de mata após operação

Dois dias após o início da histórica operação policial no Complexo da Penha, no Rio de Janeiro, cenas dramáticas voltam a expor a gravidade da violência que atinge comunidades carentes na cidade. Moradores, sob o impacto da tragédia, retiraram da mata, com as próprias mãos, cerca de 60 corpos, que foram reunidos na Praça São Lucas, centro da comunidade, na manhã desta quarta-feira (29). As imagens mostram filas de vítimas cobertas por lençóis, expostas a pedido de familiares que reivindicam visibilidade diante da imprensa, enquanto aguardam a remoção oficial pelos serviços forenses.

A Operação Contenção, que mobilizou mais de 2.500 agentes das polícias Civil, Militar e do Bope, já era considerada a mais letal da história do Rio, com 64 mortos contabilizados oficialmente até terça-feira (28), sendo 60 civis suspeitos e 4 policiais. As forças do estado justificaram a ação como uma resposta ao crescimento territorial do Comando Vermelho, responsável por violentos confrontos nas últimas semanas. No entanto, os corpos encontrados pelos próprios moradores após o confronto ainda estão fora da análise oficial. Se forem somados aos já confirmados, o número de vítimas pode ultrapassar 120.

O ativista Raul Santiago, morador do complexo, transmitiu ao vivo imagens e depoimentos chocantes, acompanhados pela denúncia de uma “chacina que entra para a história do Rio de Janeiro, do Brasil e marca com muita tristeza a realidade do país”. A população local relata terror, incerteza quanto ao número real de vítimas e indignação diante da presença ostensiva do aparato policial, que interrompeu serviços básicos, fechou escolas e obstruiu ruas, enquanto drones filmavam cenas de confrontos e criminosos tentando fugir pelas encostas de mata.

O luto toma forma pública: mulheres choram ao identificar parentes entre os corpos enfileirados na praça, enquanto a Defesa Civil inicia o trabalho de remoção. No Complexo do Alemão, vizinho à Penha, mais seis corpos foram recolhidos durante a noite pela comunidade e levados ao Hospital Getúlio Vargas. O temor é que, somando todos os cadáveres encontrados fora da contagem oficial, o balanço chegue a 130 mortos. O Corpo de Bombeiros e o Instituto Médico-Legal foram acionados, mas até o momento não há posicionamento oficial sobre esses novos achados.

Para além dos números, a operação expõe o desespero de uma comunidade afetada pela insegurança, pelo racismo estrutural e pelo uso massivo da força do Estado. O drama da Penha reflete uma história de abandono, onde moradores são atingidos tanto pela ação do crime organizado quanto pela repressão policial, aprofundando ciclos de violência e revolta.

Enquanto o governo do estado classifica a ação como “a maior operação da história do Rio de Janeiro”, o argumento é contestado por organizações de direitos humanos, que denunciam o uso excessivo da força e a ausência de políticas públicas efetivas para a redução da violência. Na Assembleia Legislativa, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos anunciou que vai cobrar explicações formais e oficiais sobre a condução desse confronto, que transformou novamente favelas do Rio em cenário de guerra.

O cenário é de luto coletivo, incerteza jurídica e política, e de um profundo questionamento sobre o modelo de segurança pública no Rio de Janeiro. O drama da Penha, além de ser uma marca trágica para a cidade, acende o debate nacional sobre a necessidade urgente de alternativas à atual política de confrontos armados em áreas urbanas marcadas pela pobreza e pela exclusão.

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)