O Brasil começa a reconhecer o profundo impacto de quase quatro séculos de escravidão, que ainda estruturam a desigualdade racial no país. Apesar do fim formal da escravidão há mais de 130 anos, pessoas negras ainda estão na base da pirâmide social, enfrentando menor acesso à renda, à terra, moradia digna e a direitos básicos essenciais. Essas desigualdades refletem-se em índices alarmantes de violência, exclusão social e discriminação sistemática, perpetuando um ciclo de vulnerabilidade histórica.
Segundo a administradora e articuladora do movimento negro Ruth Pinheiro, é fundamental que o Brasil avance no reconhecimento nacional da necessidade de reparação por esse legado histórico. Para ela, a reparação deve ser encarada como um direito que requer políticas públicas efetivas que combatam a pobreza e a exclusão estrutural da população negra. Pinheiro destaca que a sociedade precisa compreender o porquê de a maioria das pessoas negras ainda viver em favelas e ser vítima predestinada do tráfico e da prostituição, realidades que expressam as consequências do racismo estrutural não superado.
O movimento negro brasileiro também tem pressionado os países que lucraram com o tráfico de africanos no século XIX a adotarem compromissos concretos de reparação, apontando para uma responsabilização internacional que complemente as ações internas. A reflexão sobre reparação envolve medidas económicas, sociais e culturais, visando superar as disparidades.
Dados recentes mostram que a desigualdade racial afeta diversos aspectos da vida no Brasil. Pessoas negras têm taxas mais altas de desemprego e informalidade, menor escolaridade, e são majoritárias nas estatísticas de violência letal e desvantagem econômica. No campo da violência, por exemplo, 79% das mortes violentas intencionais e a maioria das vítimas de feminicídio são negras, demonstrando o racismo estrutural presente nas instituições e na sociedade.
Além disso, pesquisas revelam que a população negra sofre discriminação cotidiana generalizada, desde o tratamento desigual em serviços comerciais até a violação de direitos básicos, confirmando que o racismo permanece um fator central na manutenção das desigualdades. Mulheres negras, em particular, enfrentam discriminações múltiplas e desvantagens agravadas pela sobreposição de gênero e raça.
Apesar da existência de leis e políticas afirmativas, o Brasil ainda está distante da efetiva equidade racial, com retrocessos recentes no combate ao racismo e frequentes denúncias de violências e discriminação racial.
Portanto, o debate sobre reparação no Brasil é imprescindível para que se possa avançar no enfrentamento das desigualdades históricas e garantir que a população negra tenha acesso pleno a direitos sociais, econômicos e culturais, contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

