A mineração de manganês em Rio Preto, região no município de Marabá, sudeste do Pará, destaca-se no cenário internacional pela exportação do mineral para países como Estados Unidos, México, Noruega, China e Índia. Este metal, fundamental para a fabricação de baterias de veículos híbridos e elétricos, é considerado um insumo estratégico para a transição energética, que busca substituir combustíveis fósseis por fontes que emitam menos gases de efeito estufa. Entretanto, apesar do discurso de sustentabilidade que envolve essa demanda global, pesquisas indicam que os impactos ambientais e sociais locais podem ser graves.
Estudos conduzidos pelas pesquisadoras Ailce Alves e Larissa Santos revelam que a mineração no entorno de Rio Preto gera poeira, lama, riscos de acidentes e de rompimento de barragens de rejeitos, além de conflitos comunitários. Essas problemáticas ilustram como a transição energética, embora vista como uma solução ambiental, pode funcionar como uma máscara para práticas mineradoras que continuam a explorar e degradar territórios, exacerbando desigualdades sociais e ambientais na região.
Esse debate integra a coleção de livros “Politizando o Clima: poder, territórios e resistências”, lançada recentemente no Rio de Janeiro. A publicação, fruto de uma parceria entre a Fundação Rosa Luxemburgo, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, o Coletivo de Pesquisa Desigualdade Ambiental, Economia e Política e a Editora Funilaria, aborda as disputas políticas e econômicas em torno da política energética, com foco nas relações de poder, raça, classe e gênero, além das assimetrias entre países do Norte e do Sul global. Um dos objetivos centrais é fornecer bases para o fortalecimento da justiça socioambiental e dos movimentos de resistência contra o racismo ambiental e o colonialismo verde, que impõe condicionantes ambientais dos países ricos sobre nações em desenvolvimento.
Pesquisadores e ativistas ressaltam que o avanço das políticas e projetos oficialmente definidos como “verdes” não se dá sem resistência local. A coleção destaca múltiplas formas de luta contra a mercantilização da pauta climática e a reprodução das dinâmicas coloniais e exploratórias sob a fachada da transição energética. Esse contexto será central na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorrerá em Belém no mês seguinte, realçando a relevância das experiências locais para o debate global.
Além das questões socioambientais, o setor mineral do Pará está passando por iniciativas de modernização que visam a verticalização da produção de manganês. A empresa RMB, por exemplo, planeja integrar operações de mineração, beneficiamento e produção química em um mesmo polo industrial, com foco em produtos como monóxido de manganês para ligas metálicas usadas em turbinas eólicas e veículos elétricos, além de sulfatos com alta pureza destinados a fertilizantes, nutrição animal e baterias de íon-lítio. Essas ações buscam alinhar processos produtivos a padrões avançados de eficiência energética, automação e responsabilidade ambiental, incorporando práticas de economia circular para reduzir a pegada de carbono e gerar empregos diretos na região.
Por outro lado, a ilegalidade nas operações mineradoras permanece como problema grave no Pará. Em uma recente operação da Polícia Federal, foram apreendidas 23 mil toneladas de manganês extraído de forma irregular no município de Marabá, avaliado em cerca de 30 milhões de reais, com destino à exportação para a China. A carga foi apreendida no Porto de Itaquí (Maranhão), e investigações indicaram fraudes fiscais e divergências documentais, além da atuação de empresas com licenças suspensas. Essa situação evidencia desafios de governança e fiscalização no setor mineral local, que repercutem diretamente na economia e meio ambiente.
Assim, a mineração do manganês no sudeste do Pará surge como um exemplo complexo das contradições da transição energética global: um mineral essencial para as inovações tecnológicas sustentáveis que impulsionam a redução das emissões globais, mas cujas práticas de extração revelam impactos socioambientais severos e disputas políticas que colocam em xeque a justiça e a sustentabilidade desse processo. O debate aponta para a necessidade de políticas que considerem tanto as dimensões ambientais quanto os direitos e condições das populações locais, reconciliando o papel estratégico do manganês com o desenvolvimento socioambiental justo e inclusivo da região.

