O avanço das facções criminosas na Amazônia Legal tem transformado profundamente a dinâmica do crime organizado na região, especialmente em áreas de garimpo ilegal. O Comando Vermelho (CV), uma das organizações mais poderosas do país, já estabeleceu regras rígidas para quem atua nesses territórios, chegando a exigir cadastro e pagamento de mensalidade para garimpeiros que utilizam balsas e escarientes, equipamentos de grande escala para extração mineral. Mensagens enviadas por grupos de WhatsApp, obtidas pela Agência Brasil, deixam claro que o controle da facção é absoluto: quem não se submeter às exigências pode ter suas máquinas queimadas e até correr risco de vida.
O cenário de dominação do CV se repete em diversas cidades da Amazônia, com destaque para a Terra Indígena Sararé, em Mato Grosso, onde a facção passou a controlar toda a cadeia de extração de ouro. O garimpo, antes dominado por indivíduos isolados, agora opera sob a lógica de controle territorial armado, semelhante àquela vista em comunidades do Rio de Janeiro. O estudo Cartografias da Violência na Amazônia, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostra que o crime organizado cresceu 32% em apenas um ano, estando presente em 45% dos municípios da Amazônia Legal, totalizando 344 cidades afetadas.
A presença de facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC), Bonde dos 40, Tropa do Castelar e grupos estrangeiros, como o Tren de Aragua (Venezuela) e o Estado Maior Central (Colômbia), intensifica a disputa por territórios estratégicos, especialmente aqueles próximos à fronteira com a Bolívia, rota tradicional do narcotráfico. O Mato Grosso, com sua extensa faixa de fronteira, tornou-se um dos principais corredores para o escoamento de cocaína para mercados internacionais, utilizando portos fluviais e até “mulas” humanas.
A violência decorrente desse cenário é alarmante. Em 2024, foram registrados 8.047 mortes violentas intencionais na Amazônia Legal, taxa 31% superior à média nacional. O Amapá lidera o ranking de homicídios, seguido pelo Maranhão, onde a disputa entre CV, PCC e Bonde dos 40 tem provocado aumento nos índices de violência. Cidades como Vila Bela da Santíssima Trindade, no Mato Grosso, registraram crescimento exponencial de assassinatos, diretamente ligado ao avanço do CV e à expansão do garimpo ilegal.
A situação afeta também as mulheres, que enfrentam taxas de homicídio 21,8% superiores à média nacional. A vulnerabilidade é ainda maior em territórios afastados dos centros urbanos, onde a ausência de políticas públicas específicas agrava o problema. Especialistas alertam que o enfrentamento à violência precisa considerar as especificidades locais, especialmente em aldeias indígenas e municípios de fronteira, onde a presença do Estado é mínima.
A Pan-Amazônia consolidou-se como corredor prioritário para o tráfico internacional de drogas, abastecendo mercados da Europa, América do Norte, África e Oceania. O crescimento do crime organizado, aliado ao aumento da violência e à degradação ambiental, exige respostas integradas do Estado, que articulem segurança pública, proteção ambiental e políticas sociais para os povos originários e comunidades locais.

