A escritora Ana Maria Gonçalves tomou posse na cadeira 33 da Academia Brasileira de Letras (ABL), nesta sexta-feira (7), no Rio de Janeiro, tornando-se a primeira mulher negra a integrar a instituição em seus 128 anos de história, além de ser a mais jovem entre os atuais membros. A cerimônia, realizada no Petit Trianon, sede da ABL, contou com a participação de acadêmicos prestigiados e teve transmissão ao vivo pelo site e canal oficial da Academia.
Ana Maria Gonçalves sucede o gramático Evanildo Bechara, falecido em maio deste ano. Nascida em Ibiaí, Minas Gerais, em 1970, ela é roteirista, dramaturga, professora de escrita criativa e sócia-fundadora da Terreiro Produções. Seu trabalho é amplamente reconhecido pela obra monumental “Um Defeito de Cor”, publicada em 2006, que se tornou um marco na literatura brasileira por tratar da história da escravidão e suas repercussões na formação do país. O romance foi vencedor do prêmio Casa de las Américas em 2007 e eleito um dos livros essenciais para entender o Brasil, figurando na sétima posição na lista dos 200 livros mais importantes divulgada pela Folha de S.Paulo em 2022.
“Um Defeito de Cor” narra a trajetória de Kehinde, uma africana sequestrada ainda criança no Reino do Daomé (atual Benin) e trazida para a escravidão na Bahia. A obra relata suas experiências de sofrimento, resistência, amores, desilusões e a luta pela liberdade, culminando em seu empoderamento como empresária após conquistar a carta de alforria e retornar à África. O livro tem mais de 950 páginas e levou cinco anos para ser concluído, com longos períodos dedicados à pesquisa, escrita e reescrita. Em 2024, foi tema do samba enredo da escola de samba Portela no Carnaval do Rio de Janeiro.
Além de seu trabalho como escritora, Ana Maria Gonçalves viveu oito anos nos Estados Unidos, onde atuou como escritora residente em universidades renomadas como Tulane, Stanford e Middlebury, ministrando cursos e palestras sobre questões raciais. A cerimônia de posse na ABL foi marcada por festas e homenagens, incluindo um jantar com cardápio africano para 300 pessoas e a apresentação surpresa de um grupo musical que fez cortejo pelas ruas do centro do Rio de Janeiro.
Com sua eleição quase unânime e a entrada histórica na Academia Brasileira de Letras, Ana Maria Gonçalves representa um importante avanço na representatividade e diversidade cultural da instituição, abrindo caminho para que outras vozes negras e femininas possam ocupar espaços tradicionais da cultura brasileira. Sua trajetória literária e ativismo refletem a importância da literatura como instrumento de reconstrução da memória e da identidade nacional.

