O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu nesta quinta-feira que um eventual atraso na assinatura do acordo entre Mercosul e União Europeia pode até facilitar sua conclusão, argumentando que é preciso mais tempo para convencer os agricultores europeus de que não haverá prejuízos para eles. Em café da tarde com jornalistas, pouco antes do anúncio oficial do adiamento pela Comissão Europeia, Haddad insistiu que não existe qualquer dano aos produtores italianos e franceses, graças às salvaguardas previstas no texto negociado ao longo de mais de duas décadas.
A formalização estava marcada para este sábado, durante a cúpula do Mercosul em Foz do Iguaçu, no Paraná, mas esbarrou na resistência de França e Itália, pressionadas por seus setores agropecuários. Haddad atribuiu parte da oposição a uma exploração política de sensibilidades internas, que não reflete o conteúdo real do pacto. Ele revelou ter enviado uma mensagem ao presidente francês Emmanuel Macron, com quem mantém relação de amizade, enfatizando que o acordo transcende o âmbito comercial e carrega forte peso geopolítico. “O que está em jogo é um acordo de natureza política, com um sinal claro para o mundo de que não podemos voltar a um ambiente de tensão entre dois blocos fechados”, afirmou o ministro, descrevendo o tratado como uma “clareira” necessária em meio a tensões globais.
Mais cedo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva informou ter conversado por telefone com a primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, que não se opõe ao acordo, mas enfrenta barreiras políticas domésticas e solicitou um prazo de até um mês para sensibilizar os agricultores de seu país. “Ela pediu paciência de uma semana, dez dias, no máximo um mês”, relatou Lula. A França, principal opositora, articulou nos últimos dias o apoio de outros membros da UE para postergar a assinatura, o que foi confirmado pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, aos líderes europeus em Bruxelas: o ato foi remarcado para janeiro.
Negociado há 26 anos, o acordo criaria uma das maiores zonas de livre comércio do planeta, abrangendo cerca de 722 milhões de consumidores e um PIB combinado de aproximadamente 22 trilhões de dólares. Para os europeus, facilitaria a exportação de veículos, máquinas, vinhos e bebidas alcoólicas aos países do Mercosul – Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Em troca, abriria o mercado europeu a produtos sul-americanos como carne, açúcar, arroz, mel e soja. Do lado brasileiro, Haddad avaliou que, se os europeus precisarem de “pouco tempo” para esclarecer o tema à opinião pública, “vale a pena esperar”, pois isso poderia fortalecer as chances de aprovação final. Lula reforçou que o Mercosul está pronto para assinar, mesmo com termos mais favoráveis à UE, vendo no pacto uma defesa do multilateralismo em tempos de ascensão do unilateralismo.

