# Racismo Ambiental em Foco: COP30 em Belém Debate Desigualdades Climáticas
Durante debate na Zona Azul da COP30, em Belém, a vice-presidente da Colômbia, Francia Márquez, fez uma denúncia contundente sobre as estruturas de poder que perpetuam desigualdades climáticas globais. Em pronunciamento realizado nesta quinta-feira (13), ela afirmou que a Organização das Nações Unidas reproduz estruturas racistas ao não reconhecer plenamente o papel político e cultural de populações negras e indígenas nas decisões sobre mudanças climáticas.
“Quando falamos de racismo ambiental, tenho que começar reconhecendo que as Nações Unidas são racistas”, declarou Márquez de forma direta. Segundo a vice-presidente, esse problema não é novo. Na COP16, sobre biodiversidade, houve um esforço conjunto entre Brasil e Colômbia para que os povos afrodescendentes fossem oficialmente reconhecidos nas negociações climáticas, mas a tentativa foi bloqueada. “Disseram que não temos uma linguagem contributiva. Não somos uma linguagem, resistimos. Temos cultura e contribuímos para a conservação do meio ambiente”, rebateu.
A análise de Márquez conecta as mudanças climáticas com processos históricos de opressão. Segundo ela, o colonialismo e a escravidão estabeleceram estruturas que sustentaram um modelo econômico que hoje esgota a vida no planeta. “O colonialismo e a escravidão serviram a estruturas que sustentaram um modelo econômico que hoje esgota a vida no planeta, que expropriam a condição humana de certos povos e que os colocam em condição de inferioridade”, afirmou. Ela ressaltou que as populações afrodescendentes e indígenas da Colômbia têm sentido de forma desproporcionalmente intensa os efeitos da emergência climática como consequência direta desse sistema histórico de violências.
O conceito de racismo ambiental, central ao debate, descreve precisamente como as crises climáticas atingem de forma desproporcional povos historicamente oprimidos. “Não se pode falar simplesmente do clima, como o ar, a água e a terra, sem entender que tudo está conectado. Os mais vulneráveis são as populações racializadas, as populações que são há muito tempo objeto de violências estruturais”, completou Márquez.
O painel contou com participação de autoridades brasileiras que endossaram essa perspectiva. A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, relacionou experiências vividas em sua infância no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, às desigualdades ambientais contemporâneas. “Se chovia, o valão transbordava e a gente não podia brincar. Isso é racismo ambiental”, exemplificou. Franco também apontou disparidades concretas: a Baixada Fluminense registra temperaturas até 4°C acima da Zona Sul, área mais arborizada da cidade. Para a ministra, cada tragédia climática—incêndios, secas, enchentes—revela a brutalidade com que o racismo ambiental atinge as populações vulneráveis.
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, destacou que o governo federal está comprometido com medidas de transição justa e com ampliar o protagonismo dos povos tradicionais. Segundo ela, a COP30 está consolidando a maior participação indígena da história das conferências do clima. “A cada tragédia, vemos o quanto o racismo ambiental atinge de forma brutal as populações vulneráveis. Esta COP vai pautar esses problemas”, garantiu.
O debate reflete uma mudança mais ampla na conferência. A COP30, realizada na Amazônia brasileira, é simbólica por ser a primeira conferência climática das Nações Unidas realizada no maior bioma regulador do planeta e lar de centenas de povos indígenas. Essa localização carrega implicações políticas e ecológicas inéditas. Especialistas e lideranças indígenas têm reiterado que não basta apenas novos compromissos de redução de emissões; é necessária uma transformação estrutural da própria governança climática, incluindo as vozes historicamente excluídas: comunidades locais, mulheres defensoras, povos indígenas, populações quilombolas, afrodescendentes e juventude rural.
Entre as prioridades levantadas está a ratificação do Acordo de Escazú, primeiro tratado internacional que busca proteger defensores ambientais. O acordo, assinado pelo Brasil em 2018, ainda aguarda ratificação e implementação. Para lideranças indígenas e afrodescendentes, sua aplicação poderia marcar um ponto de inflexão na proteção daqueles que defendem a Terra, especialmente considerando que a América Latina é a região mais perigosa do mundo para defensores ambientais.
O reconhecimento dessa realidade marca um ponto de virada na narrativa climática global. A COP30 em Belém representa uma oportunidade singular para que governos da região demonstrem compromisso com justiça, vida e proteção do planeta, não apenas através de novas metas, mas pela transformação das estruturas que historicamente marginalizaram comunidades inteiras do centro das decisões que afetam seu próprio futuro.

