Portal NegoPB

Notícia de verdade.

“Ninguém faz roça sem desmatar”, diz Gilmar Mendes

# STF Julga Constitucionalidade de Benefícios Fiscais para Agrotóxicos em Sessão Marcada por Posições Divergentes

O Supremo Tribunal Federal suspendeu na quarta-feira, 19 de novembro, o julgamento sobre a constitucionalidade dos benefícios fiscais concedidos a agrotóxicos, deixando a Corte dividida em três correntes distintas sobre o tema. A sessão foi marcada por declarações polêmicas do ministro Gilmar Mendes e reafirmou as profundas divergências entre os membros da Corte sobre como equilibrar os interesses do agronegócio com a proteção ambiental e à saúde.

Durante os debates, Gilmar Mendes defendeu veementemente a manutenção dos incentivos fiscais, argumentando que o desmatamento é uma necessidade inerente à atividade agrícola. O ministro afirmou que “ninguém faz roça sem desmatar” e caracterizou as críticas sobre desmatamento como “conversa de bicho-grilo”. Mendes também ressaltou que o agronegócio brasileiro alcançou sua posição competitiva no mercado internacional graças aos investimentos em tecnologia, superando o que chamou de “neocolonialismo dominante”. O ministro completou suas observações afirmando que não incluiria a palavra agrotóxico na Constituição se fosse redator do texto e que, embora haja desmatamento, a maioria das florestas brasileiras ainda permanece preservada em uma análise comparativa.

Em contraste marcante, o ministro relator Edson Fachin votou pela inconstitucionalidade dos incentivos fiscais, acompanhado pela ministra Cármen Lúcia. Fachin argumentou que o julgamento não se trata da proibição do uso de agrotóxicos, mas da validade constitucional dos benefícios tributários concedidos a substâncias reconhecidamente nocivas à saúde e ao meio ambiente. O relator citou dados técnicos de órgãos como Fiocruz, INCA, Organização Mundial da Saúde e Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, que apontam impactos relevantes dos pesticidas na saúde pública e nos ecossistemas. Fachin defendeu que o sistema tributário brasileiro deve observar critérios ambientais com seletividade orientada pelo risco, afirmando que incentivos a substâncias tóxicas contrariam direitos fundamentais à vida, à saúde e ao meio ambiente equilibrado previstos na Constituição.

Uma posição intermediária foi adotada pelos ministros André Mendonça e Flávio Dino. Mendonça argumentou que a concessão de benefícios fiscais a insumos agropecuários é compatível com a Constituição, mas que a tributação deve ponderar entre incentivo fiscal, proteção ambiental e saúde pública. Dino acompanhou essa linha, votando por não declarar, por ora, a inconstitucionalidade dos incentivos, mas determinando que a União e os Estados realizem uma revisão técnica regular dessas desonerações para garantir conformidade com as políticas sanitárias e ambientais.

Já os ministros Cristiano Zanin, Luiz Fux e Dias Toffoli votaram pela improcedência das ações, defendendo a manutenção dos benefícios fiscais. Zanin, Alexandre de Moraes e Toffoli acompanharam os argumentos de entidades vinculadas ao agronegócio, manifestando-se pela preservação dos incentivos.

Os dois processos em julgamento foram ajuizados pelos partidos Partido Verde (PV) e Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). As ações questionam a validade do Convênio 100 de 1997, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), e da Emenda Constitucional 132 de 2023. Essas normas estabeleceram um regime tributário diferenciado para defensivos agrícolas, resultando em uma redução de 60% nas alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre esses produtos. A política fiscal também prevê isenção de IPI para o setor.

Os partidos argumentam que o Estado não pode conceder tratamento tributário privilegiado a substâncias nocivas à saúde e ao meio ambiente. Segundo sua tese, a isenção fiscal para agrotóxicos “socializa prejuízos e privatiza lucros”, na medida em que os custos ambientais e sanitários são suportados pela coletividade enquanto os lucros permanecem concentrados nas empresas do setor. Entidades como o Instituto Brasil Orgânico apontam incoerência na política fiscal, argumentando que produtos prejudiciais deveriam ser taxados progressivamente de acordo com seu grau de toxicidade, e não beneficiados.

Por outro lado, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, defendeu a constitucionalidade das desonerações, afirmando que elas não incentivam o consumo excessivo de agrotóxicos, já que se trata de produtos utilizados apenas na quantidade necessária. Para Gonet, assim como para órgãos como o Ministério da Agricultura e a Advocacia-Geral da União, eliminar os benefícios aumentaria significativamente os custos de produção, impactando diretamente o preço final dos produtos agrícolas para o consumidor.

A divisão do plenário reflete tensões mais amplas na sociedade brasileira entre a necessidade de manter a competitividade do agronegócio, setor crucial para a economia nacional, e a urgência de proteger o meio ambiente e a saúde pública. O julgamento foi interrompido sem previsão de data para sua retomada, deixando em aberto uma decisão que promete ser histórica para a política tributária e ambiental do país.

Fonte: Agência Brasil – Matéria Original (Clique para ler)
Previous post Dólar encosta em R$ 5,34 após ata de reunião do Banco Central dos EUA
Next post Ministério repudia ação da PM por causa de desenho de orixá em escola
Fechar
Menu