Praticar um ato de racismo contra um racista é racismo?
Estranho né. Mas creio que sim. Vou correr o risco.
Ontem, dia da Consciência Negra, o vice-presidente, um mestiço que atende por General Mourão, afirmou: “No Brasil não existe racismo”.
Fiquei na dúvida.
O próprio vice-presidente, cafuzo de origem, ou seja, uma mistura de negro com índio, é um alvo preferencial do racismo conservador. No Brasil colônia, não sentaria à mesa de nenhum senhor de engenho digno do título. No máximo, cearia com os cavalos.
Na melhor lógica racista, poderíamos inferir que o sangue indígena que carrega ou negro, é o responsável pela postura subserviente que apresenta frente aos “homens brancos”. Estaria domesticado ou “convertido”, como já chamaram. Seria um “negro da casa”.
Será que em uma sociedade branca, supremacista, eugênica, esse mesmo cafuzo chegaria a general?
Obviamente que não. Passaria a vida limpando porco, esterco, cortando cana e plantando algodão. General não seria.
Mas homens e mulheres melhores que ele, lutaram para que hoje esse mesmo caboré (sinônimo de cafuzo), pudesse exercer com plenitude sua liberdade, sua voz, seus direitos políticos.
Foram os quilombos e movimentos negros, os abolicionistas, a luta de Joaquim Nabuco e Luis Gama, que conquistaram os direitos que hoje o General Mourão exerce e esnoba.
São guerreiros como Francisco José do Nascimento, conhecido como “Dragão do Mar”, que recusava-se a transportar escravos em sua jangada no Ceará e, em 1881, liderou a greve dos jangadeiros contra a escravidão, que serão lembrados no panteão da história, não o general Mourão, não o cafuzo domesticado. O “negro da casa”.
Um homem negro, vai ao supermercado com a esposa e é brutalmente assassinado a socos, pontapés e sufocado até a morte por dois homens brancos, covardes. No Brasil de Mourão e Bolsonaro, é normal. Um erro de atuação da segurança que estava despreparada.
Segundo o Atlas da Violência, em 2018, os negros representaram 75,7% das vítimas de homicídios. A discrepância entre as taxas de homicídio dos dois grupos significa que para cada indivíduo não negro morto em 2018, 2,7 negros foram mortos.
Nos últimos 10 anos, os homicídios de mulheres negras, especificamente, aumentaram 12,4%, enquanto os assassinatos de mulheres não negras reduziram 11,7%.
Não são erros e despreparo. O racismo estrutural no Brasil é o responsável por milhares de mortes ano após ano. Seja pela violência, seja pela falta de oportunidades ou seja pela desigualdade social, gerada e gerida pelos conservadores racistas brasileiros, herdeiros dos engenhos e dos latifúndios.
Cito o ilustre e imortal Joaquim Nabuco:
“A escravidão não é uma opressão ou constrangimento que se limite aos pontos em que ela é visível; ela espraia-se por toda parte; ela está onde vós estais; em nossas ruas, em nossas casas, no ar que respiramos, na criança que nasce, na planta que brota do chão.”
(O abolicionismo, 1883)
Uma homenagem póstuma à João Alberto Silveira Freitas, 40 anos, brasileiro. Livre.
Por J. Laurentino
Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal NegoPB.