Boicote funciona e leva guitarrista do Radiohead a cancelar shows com israelense no Reino Unido

O guitarrista do Radiohead, Jonny Greenwood, e o músico israelense Dudu Tassa anunciaram o cancelamento de dois shows no Reino Unido após uma intensa campanha de boicote promovida por grupos pró-Palestina. Os concertos, marcados para junho em Bristol e Londres, foram suspensos devido a “ameaças” recebidas pelas casas de espetáculo e suas equipes, segundo os próprios artistas.
Campanha de boicote e alegações de “artwashing”
A mobilização foi liderada pela Campanha Palestina para o Boicote Acadêmico e Cultural de Israel (PACBI), braço do movimento global Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS). O grupo celebrou os cancelamentos e reiterou o apelo para que todos os espaços culturais recusem eventos considerados “cúmplices do genocídio em Gaza”. O PACBI acusa Greenwood e Tassa de “artwashing”, termo usado para descrever iniciativas culturais que, segundo ativistas, serviriam para suavizar a imagem internacional de Israel em meio ao genocídio contra os palestinos.
O BDS também lembrou que Greenwood se apresentou em Tel Aviv em 2024 e que o Radiohead é “talvez a banda mais conhecida que já desafiou os apelos” por boicote a Israel.
Resposta dos músicos: “censura e silenciamento”
Em resposta, Greenwood e Tassa classificaram a campanha como um ato de censura. “Forçar músicos a não se apresentarem e negar ao público a oportunidade de ouvi-los é, evidentemente, um método de censura e silenciamento”, afirmaram em nota conjunta. Eles destacaram que intimidar casas de shows não contribui para a paz e a justiça no Oriente Médio e lamentaram que a decisão seja vista como vitória por parte dos organizadores do boicote.
O projeto musical dos dois artistas, que lançou o álbum “Jarak Qaribak” em 2023, reúne músicos e vocalistas de diferentes origens do Oriente Médio, incluindo Síria, Líbano, Kuwait e Iraque. Greenwood e Tassa ressaltaram que a iniciativa sempre buscou promover a diversidade cultural e o diálogo, e que agora se veem criticados tanto por setores da esquerda quanto da direita: “Para alguns da direita, tocamos a música ‘errada’, por ser inclusiva demais. Para alguns da esquerda, só tocamos para nos absolver de pecados coletivos”.
Contexto
O movimento BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) surgiu em 2005, inspirado pelo ativismo internacional que ajudou a derrubar o apartheid na África do Sul. Seu objetivo central é pressionar Israel a encerrar a ocupação dos territórios palestinos, garantir igualdade de direitos aos cidadãos palestinos e respeitar o direito de retorno dos refugiados. Para isso, o BDS convoca consumidores, instituições acadêmicas, artistas e empresas a boicotar produtos, eventos culturais e negócios ligados ao Estado de Israel, além de promover desinvestimentos e exigir sanções internacionais.
A estratégia do boicote cultural, em especial, tem se mostrado eficaz ao isolar Israel no cenário internacional e chamar atenção para violações de direitos humanos cometidas contra os palestinos. Artistas de renome mundial, como Lana Del Rey, Shakira, Lorde, Gilberto Gil e Natalie Portman, já cancelaram apresentações em Israel após campanhas do BDS, evidenciando o impacto do movimento. Essas ações não visam indivíduos, mas sim instituições e eventos que, segundo o movimento, contribuem para a “normalização” do regime israelense e de suas políticas.
O crescimento do BDS também provocou reações de repressão. Israel e aliados aprovaram leis para criminalizar o apoio ao movimento, restringindo a entrada de ativistas no país e dificultando o financiamento de organizações que defendem o boicote. Em países europeus e nos EUA, há tentativas de equiparar o BDS ao antissemitismo, o que gera intenso debate sobre liberdade de expressão e ativismo político.
O cancelamento de shows e eventos culturais por pressão do BDS reacende o debate sobre os limites entre ativismo político, liberdade artística e segurança. Enquanto apoiadores do boicote defendem que essas ações são formas legítimas de resistência não violenta, críticos alertam para riscos de censura e restrição do diálogo cultural. O caso em tela envolvendo Jonny Greenwood, do Radiohead, e Dudu Tassa, que cancelaram shows no Reino Unido após ameaças e protestos, ilustra como o ativismo político pode impactar diretamente a circulação de artistas e a programação cultural internacional, ou seja, a circulação livre de capital.
O papel do aplicativo ‘No Thanks’ no boicote

Com o avanço do movimento, ferramentas tecnológicas têm facilitado o engajamento de consumidores no boicote. Um exemplo é o aplicativo “No Thanks”, criado para ajudar apoiadores do BDS a identificar produtos e marcas ligados a Israel. O app permite escanear códigos de barras de produtos em supermercados e lojas, informando instantaneamente se aquele item está na lista de boicote. Com interface simples e atualizações frequentes, o “No Thanks” tornou-se um recurso popular entre ativistas, ampliando o alcance do boicote ao cotidiano das pessoas e tornando mais acessível a participação no movimento global.